quarta-feira, maio 13, 2015

“Se o Brasil abrir a operação para as estrangeiras no pré-sal, podemos dizer adeus aos royalties para educação e saúde”

Viomundo

Por Conceição Lemes


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Em entrevista no último domingo, 2 de maio, o ministro das Minas e Energia, Eduardo Braga (PMDB-AM), durante entrevista realizada antes da Offshore Technology Conference, em Houston, nos Estados Unidos, deixou abertas duas portas perigosas. Acenou com mudanças no marco regulatório do pré-sal e abrandamento da norma de conteúdo local, que determina à Petrobras a compra preferencial de equipamentos e serviços de origem nacional.

Verdadeira sinfonia para os ouvidos das grandes petroleiras estrangeiras, como Shell, ExxonMobil, Chevron, BP e Total.

Até agora, Eduardo Braga não desmentiu a entrevista, que saiu em vários veículos da mídia brasileira.

Para João Antônio de Moraes, diretor de relações internacionais da Federação Única dos Petroleiros (FUP), é muito grave a declaração de Braga nos EUA.

“Onde já se viu abordar uma questão estratégica para o Brasil, fora do Brasil, num lugar onde a disputa pelo petróleo é gigantesca?”, critica. “Se já está havendo pressão sobre o Congresso Nacional para flexibilizar a partilha, com essa declaração absurda, a tendência é que a pressão só aumente.”

Nota da FUP (na íntegra, abaixo) publicada nessa quinta-feira, 7, lembra: “Só o PSDB já tem três projetos em andamento no Congresso para alterar o modelo de partilha e retirar da estatal o papel de operadora única”. Têm projetos para abrir o pré-sal às petroleiras internacionais os senadores tucanos José Serra, Aloysio Nunes e o deputado federal Jutahy Júnior. O deputado federal Leonardo Picciani (PMDB-RJ) também projeto nessa linha.

Moraes adverte: “Flexibilizar a partilha, não garantir a Petrobras como operadora única do pré-sal e abrandar a exigência de conteúdo local, como prega o ministro, significam abrir as portas para o Brasil ser saqueado novamente nos seus recursos naturais por interesses externos como já aconteceu ao longo da história, com o pau-brasil, o ouro, por exemplo”.

Ele enfatiza: “A operação só nas mãos da Petrobras nos garante desenvolvimento, segurança ambiental e segurança energética. Essas três coisas ficariam fragilizadas se empresas estrangeiras entrarem na operação”.

Ele denuncia: “Se o Brasil abrir a operação para as petroleiras estrangeiras, podemos dizer adeus aos royalties do petróleo para Educação e Saúde. No mundo inteiro, a história das petroleiras é uma história de não cumprimento da destinação social das riquezas”.

Segue a íntegra da nossa entrevista.

Viomundo — O que achou da declaração do ministro Eduardo Braga nos EUA?

João Moraes – Muito grave. Onde já se viu abordar uma questão estratégica para o Brasil, fora do Brasil, num país onde a disputa pelo petróleo é gigantesca? Se já está havendo pressão sobre o Congresso Nacional para flexibilizar a partilha, com essa declaração absurda, a tendência é que a pressão só aumente. Lembre-se de que há no Congresso vários projetos de tucanos que visam justamente flexibilizar o modelo de partilha no pré-sal.

Viomundo – O que acontece se o Brasil alterar o modelo?

João Moraes — Flexibilizar a partilha, não garantir a Petrobras como operadora única do pré-sal e abrandar a exigência de conteúdo local significam abrir as portas do Brasil para que seja saqueado novamente nos seus recursos naturais por interesses externos, como já foi ao longo da história, com o pau-brasil, o ouro, por exemplo.

Definitivamente, se o povo brasileiro não garantir esses três sustentáculos do modelo brasileiro, o ciclo econômico do petróleo vai repetir o que já aconteceu em outros ciclos econômicos. Vai embora o recurso natural, não fica o desenvolvimento aqui. Então, nós temos de realmente nos mobilizar para impedir que iniciativas para alterar o modelo de partilha tenham sucesso.

Viomundo – Em que setor do pré-sal as petroleiras internacionais podem atuar?

João Moraes – O modelo de partilha permite que elas invistam junto com a Petrobras. Foi o que aconteceu no campo de Libra, na Bacia de Campos, Rio de Janeiro. Em Libra, a Petrobras ficou com 40% dos investimentos, os europeus (Total e Elf), também com 40%, e os chineses com 20%.

Na verdade, o modelo de partilha só não permite atuar na operação. A declaração do ministro toca justamente nesse ponto. A declaração dele e os projetos dos tucanos no Congresso Nacional vão todos no mesmo sentido: o de abrir a operação do pré-sal para as petroleiras estrangeiras. Em resumo, é isso que eles e elas querem.

Viomundo – Qual o mérito da partilha?

João Moraes – As empresas estrangeiras podem investir junto com a Petrobras, mas quem vai operar é a Petrobras.

Viomundo — O que significa operar?

João Moraes – É a Petrobras que vai pegar esses investimentos, comprar os equipamentos, desenvolver os projetos e o mais importante – depois vai controlar a produção de petróleo. A Petrobras é que vai dizer se vai produzir 100 mil, 200 mil, 300 mil barris.

Viomundo — Com isso o que o Brasil tem a lucrar?

João Moraes – Primeiro, a garantia do conteúdo local, porque as empresas estrangeiras não estão cumprindo o conteúdo local nas áreas em que atuam.

Viomundo – Não estão cumprindo?!

João Moraes – Não. Elas encontram um monte de subterfúgios para não comprar aqui. A Shell, por exemplo, é a segunda produtora no Brasil. Ela tem ativos importantes nas áreas já licitadas do pré-sal. Mas a Shell não tem nenhuma plataforma encomendada aos estaleiros brasileiros.

Se flexibilizar o pré-sal vai acontecer o que já acontece com áreas licitadas antes da lei da partilha. As petroleiras estrangeiras não cumprem o conteúdo local. Não cumprindo o conteúdo local, elas não geram emprego aqui, não geram renda aqui, não geram desenvolvimento aqui. Essa é uma etapa importante do ponto de vista do desenvolvimento.

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Viomundo – O que Brasil tem a ganhar mais com o modelo de partilha?

João Moraes — Soberania energética e meio ambiente. Por que aconteceu aquele acidente importante da Chevron, no Campo de Frade, em 2012? Por que a Chevron avançou na produção além do que podia e dos equipamentos que detinha. Isso causou uma fratura no subsolo do oceano, provocando dano ambiental muito grande.

Viomundo – Mas a Petrobras não está livre de produzir danos ambientais.

João Moraes – Não está. Nenhuma petroleira está livre disso. Mas os mecanismos de pressão do povo brasileiro sobre a Petrobras são muito maiores do que sobre as petroleiras estrangeiras. Então, a Petrobras como operadora única nos dá uma garantia ambiental muito maior do que as estrangeiras.

Viomundo – O que mais o Brasil tem a lucrar mais com a partilha?

João Moraes – Impedir a produção predatória. Qual é o grande dilema que a Argentina vive hoje em dia? A Argentina privatizou a YPF. A maior empresa que assumiu foi a Repsol espanhola. A Repsol começou a ter produção predatória , não investiu em desenvolvimento de novas reservas nem em novas tecnologias. Resultado: hoje a Argentina é dependente da importação de petróleo e gás.

Viomundo — Por quê?

João Moraes — Justamente porque não era uma empresa estatal nacional que detinha a operação. Então esse é outro aspecto muito negativo dos projetos dos tucanos que estão no Congresso e buscam garantir a entrada de estrangeiras na operação.

A operação só nas mãos da Petrobras nos garante desenvolvimento, segurança ambiental e segurança energética. Essas três coisas ficariam fragilizadas se empresas estrangeiras entrarem na operação.

Viomundo – Pela lei da partilha foi criado um fundo social – o Fundo Social Soberano – que prevê a destinação dos royalties para Educação e Saúde. As petroleiras estrangeiras fariam isso?

João Moraes – De jeito nenhum. A história das petroleiras no mundo é uma história de não cumprimento da destinação social das riquezas. Então, essa batalha importante que tivemos para garantir os royalties para Educação e Saúde vai para o espaço se a operação do pré-sal for aberta para as empresas estrangeiras. Portanto, é muito ruim se acontecer isso que o ministro Eduardo Braga disse.

Viomundo – Nos últimos meses, estamos assistindo ao acirramento na disputa do petróleo brasileiro. Teria a ver com as denúncias da Lava Jato?

João Moraes – Tudo isso é fruto da campanha de desmoralização da Petrobras desenvolvida pela grande imprensa nos últimos meses. Não tem a ver com corrupção. É uma campanha antinacional. É uma campanha antipatriótica como se as nossas grandes redes de comunicação fossem de outros países e estivessem fazendo aqui uma campanha de interesse delas.

Portanto, é um absurdo sem tamanho, nessa conjuntura, um ministro de Estado ir lá fora e dar uma declaração tenebrosa como a que deu.

Mesmo que o governo tivesse a intenção, o ministro não poderia fazer essa declaração. Porque ao fazê-lo, se um dia isso vier acontecer, a Petrobras vai estar com o preço rebaixado.

Olhando pela lógica do capital, mesmo que fosse uma decisão de governo fazer isso – o que eu não acredito que seja –, ele não poderia declarar isso no exterior. Realmente um despreparo, um absurdo. É um negócio descabido.

Viomundo – A FUP pretende fazer algo em relação a isso?

João Moraes — A direção da FUP está reunida, aqui, em Curitiba, nesta quinta e sexta, onde vamos discutir o assunto. Nós trouxemos a nossa reunião mensal para cá como forma de darmos a nossa solidariedade. Na quarta-feira, inclusive, participamos de atos de solidariedade aos professores.

Mas, desde já, a sociedade tem de estar ciente. Se houver flexibilização no modelo de partilha do pré-sal, o povo brasileiro pode dizer adeus ao Fundo Social e ao uso dos seus recursos para a Educação e Saúde.

Nota da FUP publicada na quinta-feira, 7, no boletim da entidade:

Tirem as mãos do que é nosso!
Em vez de fortalecer a Petrobrás, ministro de Minas e Energia quer flexibilizar partilha

Enquanto a Petrobrás recebia o prêmio OTC Distinguished Achievement Award for Companies, Organizations and Institutions, o maior reconhecimento de uma operadora offshore por tecnologias desenvolvidas e desafios vencidos, o ministro de Minas e Energia, Eduardo Braga, pregava publicamente a redução da participação da estatal na exploração do pré-sal.

Em entrevista coletiva aos jornalistas que cobriam o evento em Houston (EUA), o ministro do PMDB não mediu palavras e anunciou que o Congresso (onde seu partido comanda a Câmara e o Senado) está aberto a alterar o modelo de partilha.

“O que se discute é a obrigatoriedade da operação. Defendo que a Petrobrás tenha direito à recusa”, declarou, alegando que a empresa não tem condições hoje de “alavancar os investimentos que a economia brasileira necessita”.

Na mesma linha foi a diretora geral da ANP, Magda Chambriard, que também participou da feira de petróleo em Houston e defendeu “uma flexibilização muito bem calibrada” da lei do pré-sal, com vistas aos leilões futuros.

Declarações deste tipo reforçam e alimentam os ataques da oposição contra a Petrobrás. Só o PSDB já tem três projetos em andamento no Congresso para alterar o modelo de partilha e retirar da estatal o papel de operadora única.

A defesa intransigente da soberania é um compromisso que deve ser honrado por um governo eleito pelos trabalhadores. A hora é de fortalecer a Petrobrás para que siga avançando na exploração do pré-sal, cuja riqueza deve ser servir ao povo brasileiro e não às multinacionais.



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