segunda-feira, julho 29, 2013

A política como dever

Em seu discurso no Theatro Municipal, o papa Francisco defendeu o primado da política. Embora cauteloso em alguns momentos, Bergoglio deixou muito claro o seu pensamento – ele se encontra ao lado de Leão XIII, de Pio XI e de João XXIII – e bem distante de Pio X, de Pio XII e de João Paulo II.
Mauro Santayana

Em seu discurso no Theatro Municipal, o papa Francisco defendeu o primado da política. Ele não disse, nem lhe era necessário dizer, que só a política assegura a sobrevivência da sociedade humana. Política, entendamos, significa a participação de todos, sob a liderança de homens capazes, na escolha de representantes para elaborar as leis e dirigir o Estado. O pontífice (e pontífice é aquele que projeta e edifica pontes) volta ao princípio basilar da ação política, que é a realização do bem-estar comum da sociedade nacional.

Desde que o homem criou a linguagem, e passou a conviver em grupos maiores, ele exerce os atos políticos, porque política é, ao mesmo tempo, a organização do convívio e a administração dos conflitos.

Os atos políticos estão inseridos na esfera do cotidiano. Eles são um esforço permanente, nunca concluso, para que a Humanidade não pereça. Não é por acaso que o Papa citou o profeta Amós e sua objurgatória contra os opressores. Ele, com o exemplo bíblico, mostra que Deus não aceita a injustiça, não compactua com a glorificação do lucro, obtido com a desalmada exploração do trabalho daqueles que alugam seus braços em troca de salários aviltantes. Ele poderia valer-se de inumeráveis advertências semelhantes, encontráveis em Isaias, na única epístola de Tiago e, praticadas, nos Atos dos Apóstolos.

Deus, em nossa visão temporal e amarrada ao silêncio da matéria, é a palavra que encontramos para identificar o Absoluto, onde se escondem as imperscrutáveis razões da vida. Só a Fé, que obedece à lógica, mas não à ciência, é que dispensa a filosofia pedestre, e dá ao homem a força da esperança.

Teólogos atentos encontraram, nos últimos escritos de Ratzinger, os sinais de debilidade diante das exigências de sua missão. Ele tenta esvaziar a mensagem política da vida de Cristo e nega a história de sua própria Igreja que, para o bem e para o mal, foi, e continua a ser, uma presença política.

Coube à Igreja, na Alta Idade Média, conservar a racionalidade greco-romana, nos territórios do Império invadidos pelos bárbaros, e aos muçulmanos manter o saber antigo em seus livros e nos grupos de sábios - os da famosa Escola de Bagdá.

Ora, essa evidência tão clara é negada pelo papa Bento 16. Em sua interpretação, não foram políticos pervertidos pela luxúria e pela simonia, por exemplo, homens como Rodrigo Bórgia, Giuliano della Rovere e Giovanni de Médici, que sob os nomes de Alexandre VI, Júlio II e Leão X, governaram a Igreja de 1492 a 1513: os anos mais escuros de toda a História do Papado.

Não há outra explicação: o discernimento do Cardeal Ratzinger não era o de um homem em pleno domínio da razão, e a sua escolha para ocupar o trono de Pedro pode ser vista como vitória política do Cardeal Bertone que, associado a Wojtyla, vinha dividindo com o polonês o governo da Igreja.

Há, mesmo na hierarquia brasileira, uma tentativa de reduzir a visita do Papa, de esvaziar a mensagem evangélica, que reclama dos jovens a responsabilidade da reabilitação da política. Embora cauteloso em alguns momentos, Bergoglio deixou muito claro o seu pensamento – ele se encontra ao lado de Leão XIII, de Pio XI e de João XXIII – e bem distante de Pio X, de Pio XII e de João Paulo II.


Mauro Santayana é colunista político do Jornal do Brasil, diário de que foi correspondente na Europa (1968 a 1973). Foi redator-secretário da Ultima Hora (1959), e trabalhou nos principais jornais brasileiros, entre eles, a Folha de S. Paulo (1976-82), de que foi colunista político e correspondente na Península Ibérica e na África do Norte.

GENRO E A MANIFESTITE: A DIREITA É QUE GANHOU !

Que tal uma nova CPMF, um imposto sobre fortunas ? O que dirão a Folha e a RBS ?

O Conversa Afiada republica entrevista do governador do Rio Grande do Sul, Tarso Genro, à excelente Sul21:

TARSO GENRO: “NÃO SEJAMOS INGÊNUOS. QUEM ESTÁ GANHANDO É O CENTRÃO”


O governador do Rio Grande do Sul, Tarso Genro, foi um dos raros casos de políticos brasileiros que colocou a cara para bater durante as manifestações de rua que sacudiram o país em junho e julho deste ano. No calor dos protestos, promoveu reuniões, entrevistas coletivas, audiências públicas, convidou os jovens manifestantes para debater e ouviu diretamente, sem nenhum filtro, críticas destes à atuação das forças de segurança e sobre outros problemas relacionados a políticas e serviços públicos. Dentro do PT, suas iniciativas acabaram tendo projeção nacional, diante do ruidoso silêncio que se ouvia então. Foi um dos primeiros a defender a necessidade de uma Constituinte exclusiva, proposta que mais tarde seria abraçada pela presidenta Dilma Rousseff e, rapidamente, bombardeada pelo “Centrão” político que comanda o Congresso Nacional e tem crescente poder inclusive dentro do PT.

Goste-se ou não de suas opiniões, do governador gaúcho não se pode dizer que pecou pela omissão. Entrou em várias bolas divididas e segue entrando. Tarso Genro está preocupado com o que considera ser uma interpretação ingênua por parte de setores da esquerda a respeito das consequências políticas de todo o processo de manifestações até aqui. O desdobramento do debate sobre a Reforma Política no Congresso, a subordinação do PT à lógica Vaccarezza, e a tentativa de desconstituição das conquistas sociais dos últimos 10 anos são alguns dos fatos apontados por Tarso para analisar a conjuntura atual. “O que está ocorrendo agora não é mais um debate sobre normas mais, ou menos, democráticas, mas um debate sobre a correlação de forças no plano da política, para a aplicação dos princípios que inspiraram a Constituição de 88. E quem está ganhando é o “centrão”, resume.

Tarso Genro expõe assim as suas principais preocupações a respeito do atual momento político no país e sobre as leituras que vêm sendo feitas sobre as manifestações de rua e suas consequências:

“A ingenuidade de uma parte da esquerda meio pollyana”

O que me pasma é uma certa ingenuidade de uma parte da esquerda meio “pollyana” a respeito das manifestações do início de julho, pela qual confundem as autênticas manifestações dos estudantes e de certos novos movimento sociais – que aliás já estão na cena pública há mais de duas décadas- com a instrumentalização que a mídia oposicionista fez do próprio movimento, direcionando-o para dois níveis: primeiro, desgastando as funções públicas do Estado, principalmente nas áreas da saúde e do transporte público das grandes regiões metropolitanas e, segundo, pretendendo “apagar” da memória popular, de forma totalitária, as grande conquistas dos governos do Presidente Lula, seguidas pelo governo atual da Presidenta Dilma, na base do “gigante acordou”, que tanto deleitou as classes médias mais conservadoras. Tudo isso veio combinado com um ataque aos partidos e aos políticos em geral, que atingem a própria democracia, que certamente na visão destes conservadores deve ser substituída por um processo “limpo”, de manejos tecnocráticos, feito por gerentes do capital financeiro.

A histórica campanha da grande mídia contra o Estado

Na verdade, ocorreram dois movimentos neste processo: um movimento tipicamente eleitoreiro da grande mídia, seguido por algumas redes sociais, preparando o ambiente eleitoral para o próximo ano, e um autêntico movimento popular, insatisfeito pelas limitações das conquistas até agora obtidas, cujo seguimento e aprofundamento, agora, só pode ser dado por novos processos de participação popular direta, inclusive para reformar o atrasado sistema político brasileiro, que já é um emperramento para que se aprofundem as conquistas sociais até agora obtidas.

Dou o exemplo da saúde pública. Quem não sabe que o SUS faz dezenas de milhões de atendimentos às populações mais pobres e que é uma das grandes conquistas do povo trabalhador do país, que salva milhões e milhões de vidas em cada ano? Pois bem, dezenas de reportagens “contra” este sistema público foram feitas precisamente no momento em que os planos privados, que eram apontados como a grande saída pelos neoliberais, entraram numa crise profunda, que ficou totalmente subsumida nos noticiários, pois o “problema”, para esta mídia, era o Estado, não o mundo privado.

Há luta ideológica sobre a saúde pública

Ambos, certamente, estavam e estão subfinanciados e o nosso SUS precisa ser muito melhorado. Mas o que foi escondido -nestes ataques ao sistema de saúde pública no Brasil- é que ele é, predominantemente bom para o povo e que o privatismo não resolveu a questão nem para a classe média que paga religiosamente os seus planos. A direita, na verdade, se propôs a uma luta ideológica, sobre a questão da saúde no Brasil, manipulando a informação, e a esquerda e os governos se recusaram a fazê-la. As lideranças de esquerda em geral, com algumas exceções honrosas, manifestaram-se “encantadas” com os movimentos, como se eles fossem uniformemente “autênticos”, não manipulados, o que não é verdade. Basta ver que quando eles saíram da domesticação induzida passaram a ser depreciados.

A falência do sistema político atual

O que preocupa não é mais simplesmente a eleição do ano próximo, pois acredito que a Presidenta vai recuperar o seu prestígio, porque o governo tem bala na agulha. O que me preocupa é o grau de governabilidade que qualquer governo terá, no próximo período, em função da falência do sistema político atual, que estimula as alianças fisiológicas que tornam os governos reféns de maiorias artificiais, e, em função da incapacidade dos estados e municípios -sejam eles quais forem- de responder às demandas populares, por melhor saúde, melhor educação, melhor transporte, em função de duas coisas: as desonerações que sacrificam as nossas arrecadações, através da redução dos valores do Fundo de Participação dos Estados e dos Fundo de Participação dos Municípios, e em função das dívidas do Estados, que não param de crescer e impedem que se obtenha novos financiamentos para obras de infraestrutura, por exemplo

A tarefa estratégica para um governo de esquerda

Reagir contra a “desindustrialização” do país e reforçar a capacidade de resposta dos Estados e Municípios -principalmente os que governam com participação popular- no próximo período é, na minha opinião, a principal tarefa estratégica de um governo democrático de esquerda, pois ,como parece que não haverá reforma política nem reforma tributária, a estabilidade política dos governos só pode ser moldada através de “remendos” no pacto federativo, mais no âmbito da política do que âmbito de reformas na legalidade vigente.

“Quem está ganhando é o centrão”

Que me perdoem os estetas da democracia formal, mas o que está ocorrendo agora não é mais um debate sobre “normas” mais, ou menos, democráticas, mas um debate sobre a correlação de forças no plano da política, para a aplicação dos princípios que inspiraram a Constituição de 88. E quem está ganhando é o “centrão”, ou seja, as mudanças que eles toleram já chegaram ao seu limite. Agora, para eles, é conservar e acalmar a plebe. Para nós deve ser mais igualdade, o que significa reforma tributária, reforma política, democratização dos meios de comunicação e mais combate às desigualdades sociais e regionais. Que tal encarar um imposto sobre as grandes fortunas e um bom CPMF, para Transportes e Saúde?

sábado, julho 27, 2013

Brasil terá seu próprio satélite

Do Tijolaço

A soberania política e econômica de um país jamais será uma realidade se não for ancorada em fatos concretos. A nossa autonomia em petróleo, por exemplo, ainda é relativa porque precisamos importar gasolina. Só a partir de 2016, quando as grandes refinarias ficarem prontas, e o petróleo do pré-sal começar a jorrar em grande quantidade lá do fundo do oceano atlântico, seremos genuinamente autônomos em petróleo, e poderemos inclusive exportar o excedente.

Na área de comunicação, ainda falta termos nosso próprio satélite, um fator fundamental hoje não apenas para controle e segurança do próprio país como para ampliar a produtividade na economia através dos serviços de telecomunicações e internet mais velozes e estáveis.

Por isso, a notícia abaixo é tão importante.

Brasil se prepara para comprar seu próprio satélite
Da RFI


Compra de satélite brasileiro mobiliza mercado da defesa
O Brasil se prepara para adquirir seu próprio satélite. O governo deve anunciar nas próximas semanas o vencedor do contrato avaliado inicialmente em 1 bilhão de reais que vem movimentado o mercado da defesa. A Telebrás e a Embraer, são as encarregadas da compra através do consórcio Visiona. Três empresas foram pré-selecionadas e estão na disputa. São elas: a japonesa Mitsubishi Eletric Company, a norte-americana Space Systems Lora,l que agora integra o grupo canadense MDA, e a franco-italiana Thales Alenia Space, que adquiriu a brasileira Omnisys, em São Bernardo do Campo.

De extrema importância estratégica, o Satélite Geoestacionário de Defesa e Comunicações (SGDC) deve entrar em funcionamento em 2016. Ele vai garantir a autonomia do governo brasileiro para a vigilância do território nacional. Além das fronteiras de floresta, outra grande preocupação brasileira é seu vasto espaço marítimo, onde, por exemplo, é extraída a maior parte do petróleo brasileiro.

O satélite também terá funções civis. Ele vai levar Internet para todo país, incluindo a plataforma marítima continental, aumentando a agilidade nos negócios e trabalhando para a inclusão digital, como parte do Programa Nacional de Banda Larga. Em entrevista à RFI, engenheiro de armamentos e diretor adjunto do Instituto de Altos Estudos de Defesa Nacional (IHEDN) em Paris, Robert Ranquet, explica como funciona essa tecnologia e fala da importância da posse de um satélite próprio na era da ciber-espionagem.

Por: Miguel do Rosário

“10%”? Esqueça: a taxa São Paulo-Siemens é 30%

A Istoé que vai às bancas hoje traz mais uma reportagem explosiva sobre o caso de corrupção promovido pela francesa Alstom e e pela alemã Siemens nos contratos com o Metrô e a Companhia Paulista de Trens Metropolitanos, ambas controladas pelo Governo do Estado.

Leia-se, portanto, José Serra e Geraldo Alckmin.

O escândalo, que não é novo, reacendeu semana passada com uma matéria da mesma revista revelando um “propinoduto” paulista. Uma reportagem publicada esta semana pela Deustche Welle, agência de notícias alemã, confirma que a Siemens, embora tivesse prometido. em 2007, esclarecer todas as suspeitas de corrupção que a abalavam, continuou operando o pagamento de propinas na aquisição de contratos no Brasil.

Como a Siemens admitiu, esta semana, que a “notificou as autoridades antitruste brasileiras sobre uma formação de cartel, com participação da multinacional alemã, para fraudar licitações para a compra de equipamento ferroviário e para a construção e manutenção de linhas de trem e de metrô em São Paulo e em Brasília”, o Ministério Público teve de abrir informações sobre o caso.

E o que revela a Istoé é – não há outra palavra – é uma corrupção cavalar.
Esqueça os famosos “10%”. O bico aqui é grande, muito grande: 30%.
Os prejuízos aos cofres públicos somente nos negócios já investigados, chegam a RS 425,1 milhões. Há muitos contatos para averiguar e o céu é o limite.

No final de 2011, já com o caso em apuração, a Siemens demitiu sumariamente – e publicando que tinha havido uma séria “transgressão às normas internas da empresa” – o seu presidente no Brasil, Adílson Primo.

Não se sabe qual foi a transgressão nem se conhece a norma interna violada. O que se sabe é que a Siemens tem um belo prontuário, que inclui multas de US$ 2,6 bilhões na Alemanha e nos EUA. E que deu cadeia para funcionários de empresa.

Há um magistral relatório sobre o assunto, publicado em dezembro de 2008 pelo The New York Times que descreve a ação da multinacional, sob o expressivo título de “Na Siemens, propina é apenas um item de série”, narrando requintes de corrupção, que era até contabilizada como NA - ”nutzliche Aufwendungen”, o que significa “dinheiro útil” em alemão.

Como sempre, a repercussão no restante da mídia será zero.
Atinge seus preferidos, então não é notícia.

Por: Fernando Brito

Tombini, do BC, joga no time dos “fracassistas”?

Do Tijolaço

O experiente jornalista de economia Carlos Marques, diretor da Istoé Dinheiro publica um artigo, nesta edição da revista, onde admite uma tese para o comportamento incongruente do presidente do Banco Central, Alexandre Tombini, que força o aumento de juros sem que haja fundamento econômico para isso.

Diz ele que Tombini, pode estar usando a “tática do burocrata que joga para a torcida” (leia-se mercado financeiro, no lugar de “torcida”), apostando numa estagnação que o legitime como “técnico salvador da pátria” para leva-lo ao Ministério da Fazenda.
Não é absurdo, porque os burocratas sem brilho gostam do dois papéis: o de parecerem vítimas humilhadas pelos chefes e o de serem os técnicos, apolíticos, sempre prontos para uma nomeação de conveniência quando a administração “política” não funciona.

O “mercado”, claro, adora estes personagens – Maílson da Nóbrega é o modelo acabado disso – que lhes são dóceis, porque precisam de legitimidade e a reger a economia – isto é, a vida real de um país – sem a legitimidade que a política e o voto devem dar a quem governa.

Leiam o texto e reflitam se Marques não pode ter razão.

O que move os fracassomaníacos?

Isto É Dinheiro

Carlos José Marques

Eles estão, mais do que nunca, ouriçados. Já decretaram o fim da estabilidade, a volta da crise, o descontrole inflacionário a minar a saúde econômica do Brasil. Para eles, não há mais saída. O Brasil perdeu a vez, vai perder os investimentos, deve perder todas as oportunidades. Qualquer indicador ou informação que ajude a minar a confiança do setor produtivo vale. Sua moeda de troca, ou de lucro, são as análises cada vez mais sombrias da catástrofe iminente. Apostam no temor geral, sabotam a economia interna e prestam um desserviço ao País, vendendo externamente a pior imagem, na ânsia por dividendos, quem sabe, pessoais.

O movimento se intensifica com a proximidade do jogo eleitoral. Como num cassino de apostas, estão girando a roleta pelo lucro fácil. O pior rende mais. Empreendedores pagam a conta e entram, como presas fáceis, na ciranda de lorotas. E, atordoados, deixam de fazer o que sabem e de garantir sua sobrevivência no tabuleiro. É certo dizer que o Brasil não experimenta o melhor momento de crescimento. Nem está mostrando um modelo ideal de administração das contas públicas. Mas está longe da recessão e do descontrole financeiro. O colchão de reservas continua em alta. A disciplina fiscal segue como regra e com metas preestabelecidas.

A inflação deve completar, neste ano, uma década dentro da meta e recuou de 0,38% em junho para 0,07% em julho, portanto abaixo do teto. Também é correto verificar que, longe de qualquer hipótese contrária, o País experimenta uma condição de quase pleno emprego, apesar da taxa recente de 6% de desemprego – uma fração do índice verificado, por exemplo, no mercado europeu. O plano de desoneração setorial, aliado aos desembolsos na área de infraestrutura, surte efeito. O Brasil, para desalento desses senhores, tem apresentado números saudáveis. O ministro Mantega anunciou um corte adicional no orçamento, da ordem de R$ 10 bilhões, suprimindo despesas com pessoal e encargos.

O contingenciamento vem se somar aos R$ 28 bilhões já economizados até então da verba total, por decisão direta da equipe econômica, que demonstra preocupação e senso de responsabilidade com o assunto. A nota destoante nesse aspecto surgiu, inesperadamente, do presidente do Banco Central, Alexandre Tombini, que em entrevista disse desconhecer como o Executivo vai arrumar suas contas, porque não cabe ao BC tratar do tema. Passou a impressão de não fazer parte desse governo. Tombini, ao que tudo indica, vem adotando a tática do burocrata que joga para a torcida, imaginando se dar bem caso o caldo da economia entorne e ele seja chamado a atuar como redentor no lugar do atual chefe. Tem, com esse comportamento, servido ao discurso dos fracassomaníacos de plantão.

Por: Fernando Brito

sexta-feira, julho 26, 2013

O colonialismo mental faz enxergar o mundo “ao contrário

Do Tijolaço

A semelhança é tão grande e repetida que não dá para considerar coincidência.

Ontem, escrevi aqui provocado por uma nota da Folha sobre os lucros da multinacional Unilever, onde se dizia que o crescimento de “apenas” 10,3 nas vendas nos emergentes tinha sido a causa do retraimento dos ganhos da empresa, embora o mercado nos países ricos tenha sido negativo em 1,3%.

É ótica distorcida dos cordeiros que pensam com a “razões do lobo”.

Mais tarde, o Estadão publicou outra matéria, desta vez com o próprio lobo falando, pela revista The Economist.
A sua capa mostra o Brasil e os demais emergentes atolados num lamaçal.

A imagem não é má, desde que se façam algumas correções.

Primeiro, o lamaçal é feito pela enxurrada de moeda que os países-lobos despejaram sobre nós, para continuar remunerando seu capital, sem opções de investimento em seus territórios queimados pela recessão econômica e seus povos com o consumo interno estagnado pelo desemprego monstruoso que se gerou por lá e pela queda de sua renda.
Segundo, era preciso desenhar umas cordinhas nas costas dos emergentes, para mostrar que eles, além de se desvencilharem da lama monetária que nos arranjaram, ainda tem que carregar o peso dessa retração econômica na estagnação do preço das matérias primas que exportam para o mundo desenvolvido, que atendem pelo pomposo nome de commodities.

A The Economist acerta ao dizer que “a Grande Desaceleração significa que as economias emergentes em expansão já não conseguem compensar a fraqueza nos países ricos. Sem uma recuperação mais forte nos Estados Unidos ou no Japão, ou um avivamento na área do euro, a economia mundial dificilmente crescerá muito mais rápido do que ao ritmo medíocre de hoje, de 3%”.

Acerta no diagnóstico, mas erra nas causas da doença.

A começar que, se de alguém seria necessário “compensação” seria deles, dos países ricos, que construíram suas riquezas ou com o saque colonial mercantil (a Europa) ou com o saque colonial monetário-financeiro, quando os Estados Unidos transformaram o dólar num bem internacional, que podiam produzir sem efeitos inflacionários, desde o final da 2a. Guerra.

Depois, porque insistem em um modelo de relações internacionais perverso, tanto nas trocas comerciais quanto nas financeiras e nas tecnológicas, onde nos exigem preços aviltados, juros suicidas e patentes escravizantes.
E – last but not the least, como dizem por lá – com o atraso e a destruição que produziram continuamente desde o final dos nos 50, pelos territórios do Terceiro Mundo. Se só a guerra do Iraque custou aos EUA mais de dois trilhões de dólares, quanto terá custado ao pobre povo daquele país bombardeado, destruído e massacrado por eles? Quanta riqueza os 190 mil mortos por lá deixaram de produzir?

É bom lembrar que diziam fazê-lo em busca de “armas de destruição em massa” que nunca foram descobertas, embora tenham descoberto mais petróleo, minérios caros, etc…

Não vamos falar do Vietnã, nem de Angola, nem da Coreia, nem do Afeganistão, nem da Líbia, nem da Síria, para não ficarmos parecendo ressentidos, não é? Nem nas dezenas de golpes autoritários que promoveram, criando elites perdulárias e insensíveis, governos corruptos e flagelos como a violência e o tráfico de drogas.
E há algum sinal de arrependimento e vontade de mudar? Nada, nadica de nada.

Países como a Grécia – e logo a Espanha e a Itália, veremos – são forçados a se ajoelhar, implorando e suplicando ajuda, à custa de mais recessão e desemprego.

A The Economist diz que “ao longo dos próximos dez anos, as economias emergentes ainda vão crescer, mas de forma mais gradual” e que ”isso marca o fim da primeira fase mais dramática da era dos mercados emergentes”
sur
Fim, uma pinóia!

Isso é o que eles desejam que façamos, quando começam a colocar o pescoço alguns centímetros fora do pântano em que estão mergulhados desde o crack financeiro de 2008.

O mundo em desenvolvimento não pode se conformar com a tal “desaceleração” além do que ela é inevitável pela recessão dos ricos. Se, em nome dos interesses dos países ricos, nos submetermos a voltar ao receituário que sempre nos impuseram e que só nos trouxe empobrecimento e crises, estamos olhando o rio da economia fluir com a visão do lobo e a nós sempre nos caberá a sede.

E continuaremos a achar estranho o desenho do artista e pensador uruguaio Joaquín Torres Garcia que reproduzo aí ao lado e não entenderemos as palavras com que ele o explica:
“Não deve haver norte, para nós,
senão por oposição ao nosso Sul.
Por isso agora colocamos o mapa ao contrário,
e então já temos uma justa ideia de nossa posição,
e não como querem no resto do mundo”


Por: Fernando Brito

PIG FAZ TERRORISMO ECONÔMICO Pochmann diz ao Edu que o PiG parece o Pravda: fala para si mesmo.

O Conversa Afiada reproduz importante entrevista que o Edu, do Blog da Cidadania, fez com Marcio Pochmann sobre a Urubóloga e congêneres de menor visibilidade:



EX-PRESIDENTE DO IPEA ACUSA A MÍDIA DE TERRORISMO ECONÔMICO


Na última quarta-feira, o IBGE divulgou os resultados da sua Pesquisa Mensal do Emprego (PME) e, apesar de trazer boas novidades, foi apresentada pela mídia, a partir dali, como sendo ruim por o desemprego de junho deste ano ter sido 0,2 ponto percentual maior do que no mesmo mês do ano passado.

Neste momento político em que os bons níveis de emprego e renda constituem o que impede Dilma Rousseff de perder ainda mais popularidade, essa distorção dos fatos não pode passar batida e, nesse aspecto, o governo viu a distorção sendo feita e, como de costume, não contestou.

No sentido de fazer a sua parte no contraponto à desinformação, o Blog foi ouvir um dos economistas mais importantes do Brasil, o ex-presidente do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA) doutor Marcio Pochmann.

Antes da entrevista, porém, alguns dados sobre o entrevistado.

Formou-se em Economia pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) em 1984. Entre 1985 e 1988 concluiu a sua pós-graduação em Ciências Políticas e foi supervisor do Escritório Regional do Departamento Intersindical de Estatísticas e Estudos Socioeconômicos (Dieese) no Distrito Federal, além de docente na Universidade Católica de Brasília.

Em 1989, mudou-se para o Estado de São Paulo, onde iniciou seu doutorado – concluído em 1993 – em Ciência Econômica na Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), tornando-se pesquisador do Centro de Estudos Sindicais e de Economia do Trabalho (Cesit), do qual seria diretor-executivo anos mais tarde, assim como membro do corpo docente da Unicamp.

Foi, ainda, pesquisador visitante em universidades da França, da Itália e da Inglaterra. Fez pós-doutorado nos temas de relações de trabalho e políticas para juventude e atuou como consultor no Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (Sebrae), bem como na Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp) e no Dieese, entre outras instituições nacionais.

No plano internacional, foi consultor em diferentes organismos multilaterais das Nações Unidas, como a Organização Internacional do Trabalho (OIT), o Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef) e a Comissão Econômica para a América Latina e o Caribe (Cepal).

De 2001 a 2004, em São Paulo, Pochmann dirigiu a Secretaria Municipal do Desenvolvimento, Trabalho e Solidariedade do governo da prefeita Marta Suplicy. A partir de 2007, passou a exercer a presidência do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), em Brasília, cujo comando deixou no ano passado para disputar a eleição para prefeito de Campinas, na qual foi derrotado.

Na entrevista a seguir, Pochmann fala sobre economia e política e deixa ver expressiva confiança no país.

*

Blog da Cidadania – Doutor Marcio Pochmann, na quarta-feira foram divulgados os dados da Pesquisa Mensal do Emprego (PME), do IBGE, referentes a junho último e, em relação a junho de 2012, o desemprego subiu de 5,8% para 6%, correto?
Márcio Pochmann – O IBGE realiza essa pesquisa em seis regiões metropolitanas, que representam um terço do Brasil, sobre o mercado de Trabalho. Mas, ainda assim, resume-se a regiões metropolitanas.

A informação relativa ao desemprego, em termos nacionais, é oferecida pelo IBGE apenas uma vez ao ano, na Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD), que é realizada no mês de setembro e divulgada sempre com um ano de defasagem.

Essa informação da PME de junho revela uma oscilação no mercado de trabalho que é sazonal, tendo em vista que no primeiro semestre de cada ano o desemprego é, em geral, superior ao do segundo semestre, quando a atividade econômica é mais acelerada.

Quem estuda o mercado de trabalho sabe, portanto, que esse resultado a que você se refere é sazonal e não apresenta nenhuma novidade.


Blog da Cidadania – No contexto em que o nível de crescimento do PIB ou a inflação vêm sendo tratados pelo noticiário econômico como sinais de que a economia está afundando, a impressão que se tem é a de que, agora, o desemprego pode se juntar a esses outros “cavalos-de-batalha”.
Ontem (25.7), editorial da Folha de São Paulo intitulado “Mudança de sinal” diz que essa “alta” constitui “Mais um sinal de esgotamento da política econômica do governo Dilma”. O senhor acha que é cabível uma conclusão como essa por conta de uma alta de 0,2% no desemprego de junho deste ano em relação a junho do ano passado?
Marcio Pochmann – A prática de terrorismo midiático não é uma novidade no Brasil. Se nós voltássemos no tempo e tivéssemos a oportunidade de analisar as manchetes de jornal de 1953, 1954 ou de 1963, 1964, possivelmente encontraríamos similitudes em relação às notícias econômicas de hoje.

Não há, a meu modo de ver, nada que possa apontar para um sinal – seja da inflação, seja do desemprego – comparável à crítica situação que vive os Estados Unidos, que vive a Europa, os quais têm, inclusive, adotado políticas econômicas que o Brasil adotou nos anos 1990 com resultados extremamente desfavoráveis ao conjunto da população.

Essa prática de terrorismo vem sendo usada, recorrentemente, desde a virada do ano passado para este ano. O “descontrole inflacionário” no Brasil foi apresentado como uma verdade absoluta.

De fato tivemos uma oscilação que acelerou a inflação por causa da safra agrícola e, como se vê, esse fenômeno vai sendo dissipado. Neste momento, há queda da taxa de inflação e, possivelmente, o Brasil vai fechar este ano – como aconteceu nos últimos dez anos – com ela dentro da meta estabelecida pelo Banco Central.

Se tomássemos como referência o que ocorreu nos anos de 2000, 2001, 2002, perceberíamos que, naqueles três anos, em nenhum deles a inflação ficou dentro da meta do Banco Central e não houve, no meu modo de ver, nenhuma manifestação midiática comparável ao que estamos vendo hoje.

Então há, de certa maneira, um terrorismo. Como hoje a inflação não se apresenta em uma trajetória de aceleração e, sim, de queda, então a nova temática passa a ser o desemprego.

O Brasil não vai crescer tanto quanto deveria, mas vai crescer mais do que no ano passado e, portanto, é muito difícil entender que nós tenhamos neste ano de 2013 um desempenho pior do que em 2012, pois se a economia vai crescer mais, ampliam-se os postos de trabalho.


Blog da Cidadania – E o nível de emprego crescerá em cima de um patamar alto. A economia brasileira gira hoje em torno de cinco trilhões de reais. Não é isso, doutor Marcio?
Marcio Pochmann – É isso mesmo. A economia brasileira encontra-se hoje entre as sete maiores economias do mundo. E o ritmo de expansão que o Brasil está conseguindo ter está ocorrendo em meio a um cenário internacional muito desfavorável.

Perceba que a China, que crescia 10, 11 por cento ao ano, está crescendo 6, 7 por cento ao ano. A Índia, a Rússia, os chamados “países-baleia”, também diminuíram o ritmo de crescimento.

Não é, portanto, um problema de ordem nacional, interna, mas uma decorrência da realidade internacional em que os países ricos estão acirrando a competição internacional e tornando difícil o manejo da atividade econômica.

Há algumas semanas houve a necessidade de se fazer um alinhamento na política monetária justamente porque o Banco Central dos Estados Unidos, sem consultar ninguém, decidiu encerrar a sua política monetária frouxa, o que indica uma subida de juros e, contiguamente, uma fuga de dólares de todas as partes do mundo rumo àquele país.

Dessa forma, o Brasil, como todos os países mais importantes do mundo, tiveram que fazer um realinhamento em suas políticas monetárias. Então, o contexto internacional termina impondo decisões de política econômica que não são aquelas mais favoráveis à expansão econômica.

Todavia, não há dúvida de que o Brasil tem um quadro muito diferente do que hoje nós estamos observando em países ricos que estão convivendo com aumento da pobreza, aumento do desemprego, aumento da desigualdade.

O Brasil está crescendo o que é possível crescer, mas com redução do desemprego, da pobreza e da desigualdade.


Blog da Cidadania – E aí, nesse momento, a gente lê um editorial no maior jornal do país em que a primeira frase é a seguinte: “São consistentes os sinais de deterioração da economia brasileira”. O editorial se intitula “Mudança de sinal” e foi publicado na Folha de São Paulo de 25 de julho de 2013.
Doutor Marcio, são consistentes os sinais de deterioração da econômica brasileira?
Marcio Pochmann – Interpretações sempre dependem de quem as define. Eu, particularmente, não vejo sinais nessa direção. Infelizmente vamos ter um ano de crescimento menor do que imaginávamos, mas nada que signifique mudança da trajetória dos últimos dez anos, que tem sido uma trajetória de crescimento e distribuição de renda.

Não vai haver nada de trágico – a menos que surja uma hecatombe, e estamos longe disso no mundo. Deveremos concluir este ano com o controle da inflação, com crescimento econômico melhor do que no ano passado e com indicadores sociais seguindo a trajetória comprovada dos últimos dez anos.


Blog da Cidadania – O senhor acredita que essa previsão de um segundo semestre melhor do que o primeiro possa sofrer influência de fatores políticos como a promoção de protestos violentos nas ruas, como os que vimos em junho, ou o senhor acha que a economia brasileira não corre o risco de ser afetada por essa questão?
Marcio Pochmann – Não percebo que a economia possa dar curso a um problema político de maior dimensão. Agora, o contrário, que a política – ou a radicalização das manifestações – pode ter um impacto na economia como um todo, evidentemente que isso é possível. Mas exigiria um grau de movimentação que não me parece observável.

O que nós tivemos em junho foi um fenômeno importante que revela um processo decorrente das próprias transformações que nós observamos nos últimos dez anos. As pessoas foram à rua não para defender a volta de um modelo econômico ultrapassado; as pessoas foram à rua para reafirmar mais direitos. Não estão satisfeitas com o que estão obtendo e querem avançar mais.

Portanto, vejo nessas manifestações um combustível para o Brasil fazer mudanças mais significativas. Não me parece que possamos chegar a uma conturbação econômica derivada das manifestações políticas.


Blog da Cidadania – Fala-se também, doutor Marcio, em problema cambial. A conta corrente externa brasileira estaria correndo risco de retornar ao desequilíbrio de outrora – leia-se durante o governo Fernando Henrique Cardoso. Então, minha pergunta é se essa questão cambial pode gerar algum problema maior ou se também nessa questão há exagero.
Marcio Pochmann – Entendo que a política macroeconômica precisa, sim, de ajustes e eles estão sendo feitos nos últimos dois anos. Essa questão das contas externas, a questão dos importados, os gastos de brasileiros com turismo no exterior, tudo isso coloca uma situação que precisamos olhar com muito cuidado.

Mas é bom lembrar, também, que o Brasil tem – e não tinha no passado – um colchão de proteção que são as reservas externas, o melhor remédio para essa situação desconfortável das contas externas.

Com essa desvalorização que tem sido observada da nossa moeda, o Brasil pode ter melhores condições competitivas nas exportações. É claro que isso não é uma resposta imediata, mas espera-se, também, que a economia mundial reaja e, assim, melhore as condições do comércio internacional. Por fim, o país está fazendo um investimento em infraestrutura que em algum momento irá abrir um ciclo de expansão na economia de longa duração.

Evidentemente, haverá que fazer ajustes pontuais…


Blog da Cidadania – Que ajustes, doutor Marcio?
Marcio Pochmann – Entendo que, assim como a China foi capaz de construir uma rede produtiva com os países do seu entorno, precisaríamos avançar nesse sentido. A economia sul-americana tem no Brasil a sua principal fonte de dinamismo. Haveria que explorar melhor essa situação.

Além disso, o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social precisaria funcionar como uma espécie de Eximbank brasileiro [Nota do Editor: estrutura dedicada exclusivamente a financiar exportações e a produção destinada ao mercado exterior] e o Fundo Soberano [Nota do Editor: fundo formado com recursos das reservas brasileiras para ser usado em investimentos] deveria ser usado de uma forma mais agressiva, permitindo ao Brasil ter maior presença em compra de empresas estrangeiras que estão com o valor de suas ações muito baixo, assim como têm feito a China, a Índia, a Suécia. Há oportunidades lá fora que o Brasil poderia aproveitar melhor tendo tantas reservas.


Blog da Cidadania – Mudando um pouco de assunto. Por que o senhor acha que a grande imprensa brasileira está tão pessimista e difunde tanto esse seu pessimismo. Ela está equivocada ou sabe que exagera, mas tem algum outro objetivo?
Marcio Pochmann – Entendo que há um aspecto estrutural em relação ao comportamento da mídia em geral. Isso porque nos últimos dez anos nós tivemos uma ascensão econômica com o surgimento de novos consumidores, mas isso praticamente em nada impactou em consumo de mídia.

Os jornais, ou perderam ou não aumentaram o número de assinantes. Nós não tivemos, portanto, um aumento significativo desses meios de comunicação em relação à sua penetração. Isso gerou uma decisão desses meios de comunicação de fazer uma espécie de “jornalismo militante”.

Lembra-me o tipo de jornalismo que se fazia na antiga esquerda, da União Soviética. Você tinha o Pravda, onde sempre tinha que haver alguma matéria contra o capitalismo porque estava-se escrevendo para militantes. E a impressão que eu tenho é que a imprensa optou por assegurar ou fidelizar os seus militantes leitores e escreve aquilo que eles querem ler.

Só não sei até que ponto essa opção é exitosa, pois, se de fato a população tivesse sua opinião formada pela mídia tradicional, não teria havido vitória do presidente Lula e da presidenta Dilma.

O que a imprensa brasileira diz do Brasil, aliás, é muito diferente do que diz a imprensa estrangeira. Então, esse paradoxo está associado a interesses econômicos de nossa imprensa que estão sendo afetados pelo conjunto da política econômica do governo.

Os principais financiadores privados da mídia privada são os bancos, o sistema financeiro, enfim, o rentismo. E certamente o rentismo não está nada feliz com o Brasil de hoje, em que se praticam taxas de juro, em termos reais, muito rebaixadas.

O setor financeiro deixou de auferir, ano passado, alguma coisa em torno de 100 milhões de reais somente com a queda da taxa de juros. Então, obviamente que a imprensa reage a políticas que prejudicam aqueles que a financiam…


Blog da Cidadania – Mas doutor Marcio, estamos falando em perda de poder da mídia enquanto o alvo dessa campanha dela de convencimento da população contra a política econômica e quem a impõe, que é a presidente Dilma, perdeu popularidade em uma proporção cataclísmica.
Não lhe parece que estamos em um momento novo? Até há poucos meses, a mídia martelava, martelava o governo e sua política econômica e chegava a pesquisa seguinte e o Lula estava cada vez mais forte, a Dilma estava cada vez mais forte. De repente, tudo isso mudou.
A pesquisa CNI-Ibope, recém divulgada, mostra nova queda da popularidade da presidente Dilma. Em entrevista que fiz na semana passada com o diretor do instituto Vox Populi, doutor Marcos Coimbra, ele disse que vê uma certa ressonância que começa a surgir dos ataques da mídia ao governo entre a sociedade.
Marcio Pochmann – Não estou querendo menosprezar o resultado das pesquisas, mas, no meu modo de ver, a perda de popularidade não é exclusiva do governo federal. Houve queda generalizada. Há um descrédito à política brasileira. Há efeitos no Poder Executivo, no Poder Legislativo, no Poder Judiciário e nas esferas federal, estadual e municipal…


Blog da Cidadania – Um momentinho, doutor Marcio. Uma informação para ajudar a sua análise. A presidente Dilma foi quem mais caiu. E houve até ganhos entre seus adversários. Políticos como Marina Silva ganharam muito na disputa da Presidência, no último período. Aécio Neves, como candidato, não perdeu nada. Dilma perdeu muito como candidata.
Marcio Pochmann – O problema é que Dilma exerce o governo. Então, é verdade que o governo perdeu apoio, mas também é verdade que outros níveis de governo também perderam apoio. Então isso também abre oportunidade para o PT, que não é governo em muitos Estados, disputar eleição neles em melhores condições.

Em São Paulo, por exemplo, Alckmin perdeu muito apoio. Então há um descrédito generalizado. E também é bom lembrar que as eleições em 2002, 2006 e 2010 foram sempre muito difíceis para o PT, que sempre venceu só no segundo turno. Não houve nenhuma eleição fácil para Lula ou para Dilma.


Blog da Cidadania – O senhor está otimista. É bom ver otimismo, mas só lembrando que Alckmin perdeu 16 pontos – ele que mandou a Polícia cometer aquela violência toda contra manifestantes – e Dilma perdeu quase 30 pontos.
Mas é bom ver otimismo em alguém com o seu nível de conhecimento da economia do país – e eu sempre digo que foi uma tragédia o senhor não ter vencido a eleição em Campinas, ano passado, porque seria um luxo para a cidade tê-lo como prefeito.
Quero agradecer muito, portanto, doutor Marcio, a atenção que o senhor me deu e, contando com a sua anuência, pretendo procurá-lo outras vezes para obter novas excelentes análises como essa que o senhor deu aos leitores do Blog da Cidadania.
Marcio Pochmann – Eu é que agradeço a oportunidade. E o parabenizo pelo seu trabalho, um trabalho corajoso, um trabalho de buscar a verdade, que é o que nos liberta.

AS RAÍZES DA REVOLTA


O professor continua analisando as causas e consequências do levante niilista que se espalhou pelo país.


DEMOCRACIA UMA VÍRGULA, ANOMALIA NIILISTA


Wanderley Guilherme dos Santos, especial para o Valor


Milhões de pessoas foram projetadas a estações de consumo e lazer das quais nunca haviam tido sequer notícia. Passado o deslumbramento, expectativas ambiciosas cresceram em velocidade maior do que caiam taxas de juros e sinais inflacionários levando a audacioso endividamento das famílias. Por fim, a ressaca veio sob forma de aguda ansiedade sobre o futuro imediato, tornando-as vulneráveis aos anúncios de que crescimento econômico em torno de 3,0% significará desastre, desemprego generalizado e uma queda livre, sem rede de proteção, dos trapézios sociais alcançados.

Rápidos deslocamentos ascendentes desenraizam as pessoas da matriz societária original, provocando crises de identidade e desorientação quanto a valores, estando por serem substituidos os anteriores, desaprendidos. Max Weber apontou a reserva de ebulição aí depositada, tanto quanto nas crises de despenhadeiro, quando enormes contingentes de trabalhadores são despejados na escala social com destino à miséria e desesperança. E, ambos, períodos de extensa anomia social, insegurança quanto a rumos e subversão de critérios de avaliação e escolha social. Atração fatal à anomia, o niilismo, o negativismo militante candidata-se a acompanhante emocional, pacificador da insegurança dos segmentos desorientados.

Seqüência já conhecida de manifestação popular reprimida com violência próxima à selvageria propiciou as condições de uma mobilização de simpatias, solidariedades e protestos claramente motivados pelo episódio paulistano de repressão ao Movimento do Passe Livre. Eram os jovens universitários, seus pais e familiares, usuários de transportes públicos, o público de boa vontade, atingido em seu sentido de justiça e de equilíbrio, além das minorias insidiosas de sempre: um nazismo renascente, proto fascistas, partidos autoritários como o PSTU, ou dado a aventuras como o PSOL, mais os predadores da democracia. Rápido, bem sucedido golpe de mão, juntando acaso e virtude, seqüestrou a alma das ruas e infestou a evidente anomia com a inclinação niilista que a marcou desde então. Todas as palavras de ordem têm sido, a partir daí, pretexto para a desmoralização das instituições democráticas, assembléias, organizações sindicais, associações voluntárias específicas, partidos políticos, em nome de um alegado vanguardismo civilizatório.

O futurismo italiano foi um movimento revolucionário das artes gráficas no início do século XX. Dissolveu-se ideologicamente no fascismo gerado pela anomia decadentista da Itália dos anos 20, igualmente irmanado ao niilismo predatório. Assustados, os líderes institucionais do Brasil têm tomado a aparência pela verdade e multiplicado a tradução do que lhes parecem comunicar as vozes das ruas. Não existem, contudo, vozes das ruas, apenas alaridos. Não foram as cartolinas pintadas que levaram as primeiras multidões às passeatas, elas surgiram algum tempo depois das marchas em busca de um porquê das próprias marchas. A seco, melhoras genéricas da saúde pública ou da educação não estimulam o deslocamento de dezenas de milhares de manifestantes. Reforma política, então, nem em cartolina apareceu. Pesquisas de opinião durante ou logo depois do calor dos protestos são tecnicamente irrelevantes, não autorizam nenhum tipo de inferência confiável.

Do mar de gente em desfile pelos dias de junho já se ausentaram há muito os de boa fé, os lúdicos, os solidários com as iniciais demandas sobre transporte, até mesmo sobre saúde e educação, bem como os movimentos tradicionais organizados. Participam hoje dos protestos, fora os incautos e ingênuos que sempre existem e lhes emprestam ar de legitimidade, grupos anômicos de jovens de algumas posses, grupos neonazistas e pré-fascistas, organizações niilistas nacionais e internacionais, além das gangues ordinárias de ladrões e assaltantes. Os que agora se mobilizam e convocam sabem que são isso mesmo, portanto cúmplices entre si. Não há jovem do Leblon que ignore os saques e depredações que irão se seguir às suas intervenções ditas pacíficas. É a esta informal coalizão de celerados que se referem os acoelhados discursos pela modernidade, pelo avanço democrático em curso, pela radicalização da participação. Desde quando movimentos pela democracia difundem o medo e intimidam fisicamente os que divergem? Na verdade, a hegemonia da atual semântica política é niilista, reacionária, antidemocrática. Mesmo as manifestações em favor de teses populares adquirem conotação truculenta. Com todo o narcisismo de que são portadores, movimentos e personalidades de grande notoriedade não conseguem desfazer a impressão de que perderam o controle sobre o emocional da população. A conjuntura é fascistóide. A pauta trabalhista das centrais sindicais era a aparência para esconder uma real tentativa de retomar a alma das ruas. Foi uma manifestação chinfrim, o dia nacional de lutas, e não recuperou a hegemonia. Ficou apenas a impressão de que reclamava do governo a extinção do fator previdenciário e a realização de uma reforma política, entre outras bandeiras costumeiras, sem conseqüência significativa.

Há quem acredite no fundo da alma que alguma mazela nacional será resolvida por reformas nas instituições políticas. Esta é uma crença sem fundamento e, às vezes, como no momento, sujeita a exasperações histéricas. Só por circunstancial ausência de normalidade argumentativa pode-se entender declarações de inegável natureza controversa como se obviedades democráticas fossem. Em recente declaração em vídeo, ao final de um debate em um centro paulista, uma professora da USP, petista orgânica, afirmou que a estrutura partidária e eleitoral vigente, consagrada na Constituição de 88, foi elaborada em 1965 por Golbery do Couto e Silva, homem da ditadura. Sem dúvida, uma retificação histórica e tanto. Em texto na revista Carta Capital (17/julho/2013), um jornalista e paladino da democracia menciona um sonho em que assistia à convocação de uma Assembléia Nacional Constituinte exclusiva, integrada pelas melhores cabeças do País. Não ficou esclarecido, contudo, qual colégio eleitoral substituiria os 140 milhões de eleitores brasileiros na escolha de suas melhores cabeças. Pior ainda, figuras profundamente reacionárias em matéria social e econômica, como as lideradas por Marina Silva, re-editam o discurso de que a maldade da política se encontra na existência de mediações entre o público e o privado, cujas fronteiras deviam ser abolidas. É o discurso totalitário em estado puro. Buscando o aplauso de míticas vozes das ruas muitos não mais escutam a própria voz.

É incompreensível a ênfase do governo e do Partido dos Trabalhadores na realização de um plebiscito por uma reforma política cuja formulação é, no mínimo, divisionista, castradora de avanços, e omissa quanto à superação de resquícios da ditadura – por exemplo, garantindo elegibilidade aos analfabetos, tema sem nenhuma audiência entre nossos democratas radicais e digitais. Incompreensível, sobretudo, quando a pauta vital do País, no momento, está sendo disputada taxa de retorno a taxa de retorno nas licitações por vir nos setores ferroviário, aeroviário, rodoviário e portuário, além dos leilões do petróleo. Disso dependem renda, emprego, crescimento, políticas sociais e progresso tecnológico. Sujeito a um cerco infernal de pressões, lobbies e, quiçá, seu tanto de sabotagem por parte de alguns empresários e investidores, o governo substitui esta pauta por um prato diversionista, com o bônus de propiciar aos adesistas a esfarrapada desculpa de que o Estado, o modelo de crescimento (denominação presunçosa), os instrumentos de administração estão esgotados. Baboseiras de quem está costeando o alambrado do conservadorismo.

As forças sociais estão anômicas. Difícil saber em que medida a epiderme niilista reflete o sentimento majoritário da população (pesquisas, no momento, são inúteis para extrapolações), submetida a uma avalanche de informações sem fonte de credibilidade assegurada. As respostas oficiais, exceto em parte a dos parlamentares, acentuo, exceto em parte a dos parlamentares, têm contribuído para ratificar a ilusão de um aprofundamento da democracia que, de fato, em sua versão expressiva e comportamental, consiste em seu oposto, na intolerância, na destruição e no ódio que contamina as mensagens das ativas redes sociais. Quanto mais cedo se mobilizar a resistência democrática ao niilismo anômico, melhor.


Não deixe de ler “Wanderley irretocável: o futuro (sombrio) dos coxinhas”.


(*) Em nenhuma democracia séria do mundo, jornais conservadores, de baixa qualidade técnica e até sensacionalistas, e uma única rede de televisão têm a importância que têm no Brasil. Eles se transformaram num partido político – o PiG, Partido da Imprensa Golpista.

CONTRA A GLOBO, A “REFORMA AGRÁRIA” DO AR Dizem que a Globo quer tirar esse vídeo do ar !

O Conversa Afiada reproduz vídeo publicado no blog O Terror do Nordeste:


EXTRA: ASSISTA ANTES DE A GLOBO ENTRAR NA JUSTIÇA

O comentário que corre nas redes sociais é que a Globo já entrou na Justiça pedindo a proibição da exibição deste vídeo.

quinta-feira, julho 25, 2013

Maria Inês Nassiff: “Se Dilma não é a favorita, quem é?”

Do Tijolaço

A jornalista Maria Inês Nassif, no site GGN, cada vez mais uma fonte de boa informação e análise, faz uma avaliação do quadro eleitoral e diz que Dilma perdeu intenção de voto essencialmente nos grupos sociais que são, historicamente, menos sensíveis a uma candidatura de esquerda. Sua avaliação é a de que ela ainda tem um saldo muito positivo de avaliação, o que torna perigoso para as forças políticas que ensaiam um desembarque de seu governo uma decisão de romper a Presidenta.
Reproduzo o texto:
Dilma perdeu popularidade, mas não a eleição

Maria Inês Nassiff
As manifestações de julho deixaram como saldo uma alta queda na popularidade da presidente Dilma Rousseff. Mas daí a tratá-la como derrotada em 2014 vai uma enorme distância. Dilma ganharia a eleição no primeiro turno, antes de julho. Após julho, leva no segundo turno. A situação política da candidata do PT, mesmo agravada por uma onda difusa de insatisfações, ainda é a de franca favorita.

Até as manifestações, Dilma se constituiu num fenômeno atípico de popularidade para uma petista. Tinha índices pouco menores que o do seu antecessor, Luiz Inácio Lula da Silva, quando este saiu do governo, mas curiosamente estavam espalhados por todas as faixas de renda, escolaridade e regiões do país. Ao longo de seu governo, o presidente mais popular da história do Brasil – mas que ainda assim ganhou um segundo mandato sendo obrigado a disputar o segundo turno – tinha simpatias concentradas na população de mais baixa renda. A partir de sua primeira eleição para a Presidência, em 2002, Lula transitou sua popularidade das faixas de mais para menos escolaridade também, em função das políticas sociais de seu governo, e deslocou o seu eleitorado do Sul e Sudeste para o Norte e Nordeste, regiões mais pobres do país. A partir do chamado escândalo do Mensalão, em 2005, perdeu massa eleitoral no Sul e Sudeste, que se tornaram redutos de votos mais conservadores. O Sudeste, hoje, é o grande suporte eleitoral do PSDB, principal partido de oposição.

Até o final do ano passado, Dilma conseguiu aumentar a sua popularidade para além da de Lula e para mais do que o PT costuma dispor em véspera de eleição. Alcançou um eleitor que o petismo deixou de dispor a partir do primeiro governo de Lula: com mais renda, mais escolarizado e morador de Estados mais ricos da Federação. Esse eleitorado mais expandido de Dilma, em relação ao de Lula e do PT, foi atraído pelo fato de a presidente ser mais distante do PT do que Lula, e pelo fato de ter assumido de forma mais visível para o público uma ação anticorrupção, com a demissão pronta de ministros denunciados pela grande mídia. No seu primeiro ano de governo, vitimou todos os ministros que foram objeto de denúncias pela mídia tradicional.

No primeiro ano de governo, portanto, Dilma conseguiu responder de forma mais eficiente que Lula ou o PT a um movimento de opinião pública alimentado pela mídia, pelos partidos de oposição e pela própria forma como o PT se comportou em relação aos dois primeiros – desde então, o partido se encolhe diante de qualquer acusação, referendando pela omissão à afirmação de que tem uma natureza eminentemente corrupta. Em pesquisas feitas no começo do ano, no quesito intolerância com a corrupção, Dilma superava Lula e o PT de longe. Pode-se dizer que o eleitor fiel do PT e de Lula os considerava pouco rigorosos em relação à corrupção e até os perdoava, por considerarem que o governo de Lula trouxe outros benefícios mais tangíveis. Dilma era vista como apartada dessa realidade, uma governante que veio depois e não tinha nada a ver com a história que, há dez anos, persegue o partido como um fantasma ressuscitado pela Justiça e pelos meios de comunicação nas vésperas de todas as eleições. Como o PT tem vencido todas, desde então, persiste no erro de considerar que a repetição do mantra PT-Lula-Mensalão-corrupção não interfere sobre o voto e nem tem o poder de contaminação sobre outras classes sociais que não as conservadoras, as mais sensíveis a uma ofensiva udenista que mistura discurso anticorrupção com a aversão à ascensão social das classes que estão na base da pirâmide social.
O fato é que o saldo das eleições municipais foi bom para o PT, apesar do julgamento do Mensalão. Mas, como era de se esperar, a decisão do calendário de julgamento produziu o seu saldo político. Ao final dele, o circo midiático montado dentro do Supremo Tribunal Federal conseguiu colar ainda mais o Mensalão em Lula e Dilma. O espetáculo proporcionado pelos ministros do Supremo, que jogaram réus aos leões em um julgamento cheio de falhas, teve um efeito contaminador da opinião pública que coroou a campanha sistemática da mídia e dos partidos de oposição nos últimos oito anos. O STF foi mais eficientemente politicamente do que os próprios partidos políticos de oposição.

A isso se somou uma grande queda nas expectativas da economia. As pesquisas de popularidade de Dilma antes das manifestações de julho são interessantes. A grande maioria dos entrevistados tem emprego e não tem receio de perdê-lo; não existe um alto grau de endividamento de suas famílias; e existe um reconhecimento de que a vida deles melhorou nos últimos anos. A expectativa em relação ao futuro e à renda, todavia, vem se deteriorando. Ou seja, os entrevistados reduziram suas expectativas em relação ao futuro não porque suas vidas pioraram, mas porque acham que podem piorar. Parece mais uma ansiedade em relação às interpretações da mídia sobre a economia – em especial a Rede Globo, que continua a mais assistida no país – do que propriamente uma situação que interferiu no bem-estar deles. Em relação à classe média tradicional, todavia, existe um certo “achatamento” salarial e de expectativas – essas faixas da população não tiveram qualquer aceno de ascensão financeira nos últimos governos. A renda da classe média tradicional foi congelada na última década.

Esse conjunto de fatores, potencializado pelas manifestações de julho, acabou trazendo Dilma para uma realidade que foi a de todo candidato petista antes das eleições. Dilma incorporou faixas de rejeição tradicionais ao PT e a Lula: de renda alta e escolaridade alta e de regiões mais conservadoras. Lula, em 2006, viveu a mesma situação, disputou um segundo turno e venceu.Nada indica que Dilma tenha condições mais desfavoráveis do que Lula – pelo menos não neste momento. Os programas sociais que elegeram Lula para um segundo mandato foram aprofundados em seu governo. O processo de desgaste que atingiu todo o quadro partidário neste mês de julho manteve a reserva de mercado de votos do PT, em torno de 25%, índice do qual parte qualquer candidato seu. A candidata que aparece em segundo lugar nas pesquisas de hoje, com chances de ameaçar sua vitória, é Marina Silva, que sequer um partido constituído tem. Marina herdou, aparentemente, os votos de maior renda e mais escolaridade que Dilma perdeu nos últimos meses, mas bandeiras mais progressistas de direitos civis, que atraem essas camadas que são conservadoras em outras áreas da política, terão pouco trânsito na campanha da candidata. Existe uma dificuldade intransponível para uma pessoa convictamente evangélica transitar temas como casamento de homossexuais, aborto ou pesquisas com células-tronco, por exemplo.

Dilma, enfim, não foi derrotada pelas ruas. Se aliados de conveniência querem pular fora já, podem estar cometendo um grande erro. A melhor forma de avaliar isso é: se não for Dilma a vitoriosa, quem vai ser? A resposta a essa pergunta mostra que a vida dos outros candidatos é muito mais difícil que a da presidente da República.

Por: Fernando Brito

Juros matam. Matam a economia e matam vidas

Do Tijolaço

O jornalista Paulo Moreira Leite publica hoje, em seu blog na Istoé, um artigo que deveria ser um látego nas consciências dos nossos analistas de economia e nos dirigentes do Banco Central.
Deveria doer, mas não doerá, porque suas consciências petrificaram-se pelo monoteísmo do mercado e já não conseguem ver que economia são pessoas, não números.
Não é preciso ser socialista para ver isso – Keynes está aí, como prova – mas é preciso não ser um fanático emburrecido para não ver que o Brasil não pode suportar, indefinidamente, a sangria que lhes faz o mundo do capital que se descolou da produção e do consumo e vive de um rentismo do século retrasado, embora agora informatizado.
Juros altos, incoerentemente altos, senhores do mercado, vão matar uma das poucas coisas que ainda funciona na economia mundial: os países em desenvolvimento, porque os que são seus modelos vivem a mais tristes das decadências.
Leiam o excelente texto de Paulo Moreira Leite:
Hipocrisia de fraque & cartola
Paulo Moreira Leite
O desemprego subiu para 6%, contra 5,8% em maio. Milhares de pessoas não conseguiram o trabalho que procuravam e isso não é bom para ninguém.
A rigor, contudo, não é um patamar alto, ainda que seja uma raridade. Só em 2002, quando o Brasil era governado por Fernando Henrique Cardoso, o país teve um desemprego maior do que 6% em junho.

A preocupação sobre os 6% se justifica por uma pergunta: este número aponta para uma tendência de novas altas no futuro?

Impossível saber agora.

A leitura da maioria de nossos observadores sugere impressões falsas sobre o comportamento da economia.

Dá a impressão de que possíveis altas do desemprego, com queda do salário e a reversão de um ambiente espantosamente saudável quando se olha para o mundo lá fora, inevitavelmente estão a caminho.

Isso porque o país estaria condenado, por leis da natureza ou castigos divinos, por ter se recusado a cumprir o ABC do pensamento monetarista. Claro que não é assim.

A queda no emprego pode ser acentuada, estancada ou mesmo revertida – ainda que parcialmente – pelas mesmas decisões que levaram aos 6%.

(Nunca é demais lembrar o óbvio. O desemprego no país encontra-se num patamar baixíssimo, muito próximo do pleno emprego, o que torna ilusório imaginar novas reduções).

Os 6% obrigam, no entanto, a falar de uma certa hipocrisia. Foi em abril, sob uma pressão violentíssima da turma de fraque & cartola, que o Banco Central cedeu e modificou a taxa de juros – este sim, um sinal poderoso e de efeitos materiais bem conhecidos sobre o conjunto da economia.

Em redução desde agosto de 2011, quando sofreu um golpe histórico para baixo, em abril de 2013 o juro subiu de 7,25% para 7,50% naquele momento. Depois, foi para 8% e agora se encontra em 8,5%. Assim, a jato, com se o país estivesse com uma grande tragédia pela frente.

É claro que, do ponto de vista de quem vai às compras, ou precisa de recursos para investir, uma cascata de três altas consecutivas teria de produzir algum efeito, concorda?

Quando se olha para a alta do desemprego – levíssima em si, assustadora como prenúncio — cabe fazer a pergunta real: mas não era isso mesmo que se queria?

O argumento nominal pela alta de juros era a alta da inflação. Mas era uma tese nominal, que não encontrava apoio nos números reais. No mês a mês de 2013, a inflação encontrava-se – e ainda se encontra — em queda desde fevereiro, mas isso nunca incomodou nossos analistas. Isso porque o objetivo não era nem nunca havia sido vencer uma inflação que, por qualquer parâmetro, seguia uma das mais baixas da história e longe de qualquer quadro ameaçador.

O que se queria era um sinal político. Cobrava-se do governo Dilma uma demonstração enfática de seu compromisso de impedir novas altas inflacionárias. Não havia, rigorosamente, um quadro econômico para justificar a alta dos juros. Havia um ambiente político e era assim, no círculo que discute economia no Planalto, que a alta se justificou.

O Banco Central cedeu e os juros voltaram a subir.

A economia melhorou? O ambiente está mais otimista? A confiança retornou? Nem um pouco. A economia de mercado nem sempre obedece a seus psicólogos. Os ganhos do mercado financeiro voltaram a engordar? Sem dúvida.

O rentismo é uma tremenda força da natureza nos investimentos da turma fraque & cartola. Engorda seu patrimônio pessoal e também alimenta o caixa de empresas. Após décadas de financeirização econômica, empresários produtivos compensam perdas na indústria e no comércio com ganhos nas aplicações em títulos do governo.

Mas não é só isso. Não estamos falando de bilhões que podem ser perdidos e mais tarde recuperados. Isso é o dia-a-dia.

Em julho de 2013, a questão é outra, envolve o poder de Estado sobre a sexta economia do planeta, onde o bloco político liderado por Luiz Inácio Lula da Silva tentará vencer o quarto mandato consecutivo. Em caso de vitória, uma opção política que seria possível definir como jucelinismo de esquerda poderá completar 16 anos à frente do Estado.

Nada mau, considerando-se que outros juscelinismos — o de JK e outros semelhantes — chegaram a ter problemas até para serem empossados e mesmo para terminar um único mandato.

A campanha de 2014 será travada na economia.

É certo que, num ambiente de guerra total, não haverá trégua em nenhum terreno, mesmo naqueles em que a miséria nacional clama por uma ação do Estado – como a saúde publica e seus médicos ausentes – nem na reabilitação de nossos costumes políticos, que obriga a pensar numa reforma capaz de ampliar as bases de nossa democracia.

Mas é na economia, que define o bem-estar da população e o grau de satisfação com cada governo, que a eleição irá se resolver.

Os adversários, unidos pela esperança de fazer um todos-contra-um, têm um ano e dois meses para construir uma candidatura viável e criar um ambiente desfavorável à presidente, contando com composição de flores e plantas como Marina Silva e José Serra, Aécio Neves e Eduardo Campos, quem sabe sob as bênçãos de Joaquim Barbosa.

Neste vale-tudo, o esforço principal é questionar, de alto a baixo, um elemento básico nas decisões que fazem o destino de um país, seja a do empresário que resolve investir em seu negócio, seja do cidadão que sai de casa para o trabalho e do estudante que ocupa a rua em protesto.

Em todos os casos, o que está em jogo é a confiança no governo, elemento químico que envolve a capacidade de Dilma em defender as conquistas realizadas até aqui, impedir que sejam dizimadas palmo a palmo, centímetro por centímetro, como ocorre hoje com as antigas fortalezas de bem-estar da Europa, e dar conta dos progressos necessários, que os protestos de rua apontaram em nuvens de muita clareza e confusão também.

O confronto que se aproxima envolve aspectos objetivos e subjetivos e todos sabem que eles se alimentam mutuamente. Cada número desfavorável será ampliado e exagerado. Cada número positivo será escondido, amenizado. Empenhados em auxiliar uma oposição “fraquinha”, não é preciso esperar uma visão isenta nem equilibrada da maioria dos meios de comunicação. Se já era ruim quando o país crescia a 7,5%, imagine agora.

Já li quem dissesse que os 6%, ainda um dos menores índices de desemprego do mundo e da história do Brasil, são a prova definitiva da desagregação da política econômica.

Calma, gente.

O aumento no desemprego foi leve e pode ter sido breve.

É um sinal de que medidas que supostamente deveriam proteger o bolso dos brasileiros estão produzindo efeito – negativo.

Os 6% podem ser um sinal superficial ou uma brecha que anuncia uma rachadura em todo edifício. Dependem, essencialmente, das respostas que o governo der a eles.O desemprego subiu para 6%, contra 5,8% em maio. Milhares de pessoas não conseguiram o trabalho que procuravam e isso não é bom para ninguém.
A rigor, contudo, não é um patamar alto, ainda que seja uma raridade. Só em 2002, quando o Brasil era governado por Fernando Henrique Cardoso, o país teve um desemprego maior do que 6% em junho.

A preocupação sobre os 6% se justifica por uma pergunta: este número aponta para uma tendência de novas altas no futuro?

Impossível saber agora.

A leitura da maioria de nossos observadores sugere impressões falsas sobre o comportamento da economia.

Dá a impressão de que possíveis altas do desemprego, com queda do salário e a reversão de um ambiente espantosamente saudável quando se olha para o mundo lá fora, inevitavelmente estão a caminho.

Isso porque o país estaria condenado, por leis da natureza ou castigos divinos, por ter se recusado a cumprir o ABC do pensamento monetarista. Claro que não é assim.

A queda no emprego pode ser acentuada, estancada ou mesmo revertida – ainda que parcialmente – pelas mesmas decisões que levaram aos 6%.

(Nunca é demais lembrar o óbvio. O desemprego no país encontra-se num patamar baixíssimo, muito próximo do pleno emprego, o que torna ilusório imaginar novas reduções).

Os 6% obrigam, no entanto, a falar de uma certa hipocrisia. Foi em abril, sob uma pressão violentíssima da turma de fraque & cartola, que o Banco Central cedeu e modificou a taxa de juros – este sim, um sinal poderoso e de efeitos materiais bem conhecidos sobre o conjunto da economia.

Em redução desde agosto de 2011, quando sofreu um golpe histórico para baixo, em abril de 2013 o juro subiu de 7,25% para 7,50% naquele momento. Depois, foi para 8% e agora se encontra em 8,5%. Assim, a jato, com se o país estivesse com uma grande tragédia pela frente.

É claro que, do ponto de vista de quem vai às compras, ou precisa de recursos para investir, uma cascata de três altas consecutivas teria de produzir algum efeito, concorda?

Quando se olha para a alta do desemprego – levíssima em si, assustadora como prenúncio — cabe fazer a pergunta real: mas não era isso mesmo que se queria?

O argumento nominal pela alta de juros era a alta da inflação. Mas era uma tese nominal, que não encontrava apoio nos números reais. No mês a mês de 2013, a inflação encontrava-se – e ainda se encontra — em queda desde fevereiro, mas isso nunca incomodou nossos analistas. Isso porque o objetivo não era nem nunca havia sido vencer uma inflação que, por qualquer parâmetro, seguia uma das mais baixas da história e longe de qualquer quadro ameaçador.

O que se queria era um sinal político. Cobrava-se do governo Dilma uma demonstração enfática de seu compromisso de impedir novas altas inflacionárias. Não havia, rigorosamente, um quadro econômico para justificar a alta dos juros. Havia um ambiente político e era assim, no círculo que discute economia no Planalto, que a alta se justificou.

O Banco Central cedeu e os juros voltaram a subir.

A economia melhorou? O ambiente está mais otimista? A confiança retornou? Nem um pouco. A economia de mercado nem sempre obedece a seus psicólogos. Os ganhos do mercado financeiro voltaram a engordar? Sem dúvida.

O rentismo é uma tremenda força da natureza nos investimentos da turma fraque & cartola. Engorda seu patrimônio pessoal e também alimenta o caixa de empresas. Após décadas de financeirização econômica, empresários produtivos compensam perdas na indústria e no comércio com ganhos nas aplicações em títulos do governo.

Mas não é só isso. Não estamos falando de bilhões que podem ser perdidos e mais tarde recuperados. Isso é o dia-a-dia.

Em julho de 2013, a questão é outra, envolve o poder de Estado sobre a sexta economia do planeta, onde o bloco político liderado por Luiz Inácio Lula da Silva tentará vencer o quarto mandato consecutivo. Em caso de vitória, uma opção política que seria possível definir como jucelinismo de esquerda poderá completar 16 anos à frente do Estado.

Nada mau, considerando-se que outros juscelinismos — o de JK e outros semelhantes — chegaram a ter problemas até para serem empossados e mesmo para terminar um único mandato.

A campanha de 2014 será travada na economia.

É certo que, num ambiente de guerra total, não haverá trégua em nenhum terreno, mesmo naqueles em que a miséria nacional clama por uma ação do Estado – como a saúde publica e seus médicos ausentes – nem na reabilitação de nossos costumes políticos, que obriga a pensar numa reforma capaz de ampliar as bases de nossa democracia.

Mas é na economia, que define o bem-estar da população e o grau de satisfação com cada governo, que a eleição irá se resolver.

Os adversários, unidos pela esperança de fazer um todos-contra-um, têm um ano e dois meses para construir uma candidatura viável e criar um ambiente desfavorável à presidente, contando com composição de flores e plantas como Marina Silva e José Serra, Aécio Neves e Eduardo Campos, quem sabe sob as bênçãos de Joaquim Barbosa.

Neste vale-tudo, o esforço principal é questionar, de alto a baixo, um elemento básico nas decisões que fazem o destino de um país, seja a do empresário que resolve investir em seu negócio, seja do cidadão que sai de casa para o trabalho e do estudante que ocupa a rua em protesto.

Em todos os casos, o que está em jogo é a confiança no governo, elemento químico que envolve a capacidade de Dilma em defender as conquistas realizadas até aqui, impedir que sejam dizimadas palmo a palmo, centímetro por centímetro, como ocorre hoje com as antigas fortalezas de bem-estar da Europa, e dar conta dos progressos necessários, que os protestos de rua apontaram em nuvens de muita clareza e confusão também.

O confronto que se aproxima envolve aspectos objetivos e subjetivos e todos sabem que eles se alimentam mutuamente. Cada número desfavorável será ampliado e exagerado. Cada número positivo será escondido, amenizado. Empenhados em auxiliar uma oposição “fraquinha”, não é preciso esperar uma visão isenta nem equilibrada da maioria dos meios de comunicação. Se já era ruim quando o país crescia a 7,5%, imagine agora.

Já li quem dissesse que os 6%, ainda um dos menores índices de desemprego do mundo e da história do Brasil, são a prova definitiva da desagregação da política econômica.

Calma, gente.

O aumento no desemprego foi leve e pode ter sido breve.

É um sinal de que medidas que supostamente deveriam proteger o bolso dos brasileiros estão produzindo efeito – negativo.

Os 6% podem ser um sinal superficial ou uma brecha que anuncia uma rachadura em todo edifício. Dependem, essencialmente, das respostas que o governo der a eles.
Por: Fernando Brito

Os estudantes de economia de Harvard têm motivo para uma nova revolta

Em 2011, um protesto pôs alvo no professor Greg Mankiw. Os seus 70 alunos abandonaram a sala de aula, afirmando que a orientação do curso dele contribuía para perpetuar a desigualdade econômica nos EUA. Agora, um novo artigo de Mankiw defende que o salário é vinculado diretamente à contribuição ao produto social do trabalhador. Por Alejandro Nadal, do SinPermiso
Alejandro Nadal

No dia 2 de novembro de 2011, os 70 estudantes do curso de economia do professor Greg Mankiw, na Universidade de Harvard, decidiram sair da sala de aulas como ato de protesto. Em uma carta aberta a seu professor, os estudantes criticaram o fato de ele não oferecer uma discussão adequada sobre os fundamentos da teoria econômica. Também afirmaram que o curso tampouco brindava perspectivas críticas sobre a teoria econômica convencional nem opções alternativas através de outros enfoques teóricos. Nos tempos que correm, essas duas acusações são bastante sérias.

Os alunos anunciaram em sua carta de protesto que estavam fartos do caminho imposto no curso de Mankiw. Explicitamente afirmaram que a orientação do curso contribuía para perpetuar a desigualdade econômica que hoje marca a sociedade estadunidense. Essa é uma imputação grave levando em conta que hoje, nos Estados Unidos, o coeficiente de Gini para medir a desigualdade (o indicador mais utilizado para medir níveis de concentração na distribuição do ingresso) é de .48 e constitui um dramático testemunho do fracasso da política econômica da economia capitalista mais desenvolvida do mundo. Esse indicador no México é de .49, o que diz muito sobre o péssimo desempenho da economia estadunidense.

Mas os bravos professores de economia filiados ao establishment não têm medo de nada. Hoje Mankiw está publicando em uma prestigiosa revista acadêmica um artigo com o provocador título “Em defesa do um por cento”. O texto começa afirmando que nos últimos 40 anos o ingresso médio nos Estados Unidos cresceu, mas dito crescimento não foi uniforme: para o um por cento no alto da pirâmide social o aumento do ingresso foi muito mais alto que a média. Segundo Mankiw, isso se deve a que as pessoas no um por cento realizaram grandes contribuições à economia do país norte-americano.

O texto do professor recorre, em diferentes momentos, à ideia de que a remuneração que as pessoas recebem está em proporção direta à sua contribuição ao produto social. Os que recebem pouco em termos de compensação salarial, por exemplo, realizam uma exígua contribuição ao produto. Do contrário, os que percebem grandes ingressos o fazem porque realizaram grandes contribuições ao produto e ao bem-estar social.

Em seu artigo, Mankiw redescobre a teoria marginalista sobre a distribuição. O sentido chave desta teoria é que a distribuição do ingresso em uma economia (capitalista) está determinada pela produtividade marginal dos fatores da produção, capital e trabalho. Os fatores da produção percebem como remuneração o que corresponda a sua contribuição à produção social. Cada trabalhador recebe como remuneração sua contribuição marginal ao produto.

Entre 1965 e 1975 se desatou uma importante controvérsia entre os seguidores dessa teoria e um grupo de professores da Universidade de Cambridge, Inglaterra. Nessa disputa a teoria marginalista recebeu uma crítica decisiva. Os críticos, com Piero Sraffa, Joan Robinson e Pierangelo Garegnani à cabeça, demostraram que não havia maneira de medir o fator chamado capital de maneira independente da distribuição. Essa crítica demostrou que a teoria da produtividade dos fatores sofria de uma circularidade fundamental. Só é possível determinar a produtividade do capital conhecendo o preço dos bens de capital (porque isso é o que permite somar máquinas heterogêneas e edifícios de todo tipo), mas os preços não são independentes da distribuição do ingresso e, no caso do capital, o preço depende da taxa de lucro. Portanto, para conhecer a produtividade do capital é necessário conhecer a taxa de lucro, mas para isso é necessário conhecer: a produtividade do capital!

Os seguidores da teoria da produtividade marginal compraram a briga, mas seu caso estava perdido. No final, o sumo pontífice da seita neoclássica, Paul Samuelson, aceitou a derrota em um célebre artigo publicado em 1966. Esse reconhecimento devia ter sido suficiente para abandonar o enfoque marginalista. Mas a contribuição ideológica que realiza essa teoria é chave e os poderes estabelecidos resistem em perdê-la.

A conclusão do debate é clara: a distribuição do ingresso não está determinada por fatores técnicos na economia. A distribuição se define, como bem afirmou Sraffa há já 50 anos, por forças que estão fora do sistema econômico e depende de coisas como a força relativa das uniões de empresários e dos sindicatos dos trabalhadores. Não há nenhuma razão técnica pela qual os salários devem ser baixos ou inclusive miseráveis. Tampouco há motivos tecno-econômicos para justificar os descomunais ingressos do um por cento da população que Mankiw quer defender, por mais que insista que suas contribuições à economia guardam proporção com esses ingressos.

Alejandro Nadal é membro do Conselho Editorial de SinPermiso.

Tradução: Liborio Júnior

COMENTÁRIO E & P

Na Universidade de Harvard estudaram Gustavo Franco e Domingos Cavallo que afundaram o Brasil e a Argentina. Jeffrey Sachs foi consultor econômico do governo neoliberal da Bolívia na época e traçou um plano que deu em calamidade pública com a privatização até da água e o aumento da pobreza na população boliviana. O curso de economia dessa universidade deveria ser fechado ou então proibido que estudantes latino-americanos o façam.Para o bem do povo das Américas.

quarta-feira, julho 24, 2013

PAÍS GASTA COM JUROS 13 VEZES O CUSTO DO PROGRAMA ‘MAIS MÉDICOS’

O Conversa Afiada republica artigo do Saul Leblon, da Carta Maior:

Em tese, a política fiscal seria o espaço da solidariedade no capitalismo.


Caberia a ela transferir recursos dos mais ricos para os fundos públicos, destinados a contemplar os mais pobres e o bem comum.

A sonegação praticada pela Globo (R$ 615 milhões) e aquela que teria sido cometida pelo presidente do STF, (Joaquim Barbosa, noticia-se, teria adquirido apartamento de R$ 1 milhão, declarando gasto de R$ 10 reais), são pequenas ilustrações da afronta a esse princípio, facilitadas, no caso, pelo acesso (legal?) a operações em paraísos fiscais

Palavras como ética, transparência, republicanismo, justiça, interesse público soam constrangedoras quando a contraface do emissor é a sonegação.

Sem carga tributária adequada não se constrói uma Nação, mas um ajuntamento conflagrado.

A carga tributária adequada depende do estágio de desenvolvimento da sociedade. Mas não apenas isso. Sua composição é decisiva na incidência regressiva ou redistributiva que provoca.

Um país como o Brasil, com 200 milhões de habitantes e enormes carências estruturais, não pode avançar com uma carga equivalente a da Europa, cuja infraestrutura está consolidada (nos dois casos, a carga média gira em torno de 36%; mas há vários países com infraestrutura madura onde a carga passa de 40%).

O sistema brasileiro avulta, ademais, como um caso pedagógico de regressividade.

Impostos indiretos, embutidos nos preços dos bens de consumo, representam mais de 60% do que se recolhe.

Não importa a renda do consumidor: ganhe um ou 100 salários mínimos por mês, o imposto que paga por litro de leite é o mesmo.

Regressividade é isso: uma engrenagem fiscal feita para taxar mais os pobres do que os ricos.

O imposto sobre o patrimônio, em contrapartida, que incide diretamente sobre os endinheirados, não chega a 3,5% da arrecadação total.

Nem é preciso ir à Suécia para um contraponto.

Na festejada Coréia do Sul, meca da eficiência capitalista, ele é da ordem de 11%; nos EUA passa de 12%.

A taxação direta, no Brasil, recai fortemente sobre os assalariados da classe média (amplo sentido), o que explica, em parte, a revolta com a qualidade dos serviços públicos obtidos em troca.

Cerca de 25% da receita fiscal incide diretamente sobre a renda, assim:

a) a metade sobre o holerite da classe média;

b) a outra metade sobre os ganhos de capitais, que é onde se concentra cada vez mais a riqueza no capitalismo financeiro dos nossos dias.

Bancos, por exemplo, pagam menos impostos no Brasil que o conjunto dos assalariados.

As distorções não param aí.

A receita obtida tampouco se destina automaticamente a reduzir abismos sociais.

Há filtros de classe pelo caminho

A dívida pública é o principal deles.

Ela funciona como uma espécie de reforço na regressividade do sistema fiscal brasileiro.

Assemelha-se a uma coleira, um enforcador que subordina o princípio da solidariedade à primazia rentista.

O mecanismo é ‘autossustentável’.

Vejamos.

Sem espaço político para taxar endinheirados e o seu patrimônio, afinal, o Estado tem que ser mínimo, diz o cuore neoliberal, governos são compelidos cada vez mais a compensar a anemia tributária com endividamento público.

Emprestam e pagam juros por aquilo que deveriam arrecadar.

Do ponto de vista do dinheiro grosso, um belo negócio.

Em vez de impostos adicionais, investimentos em títulos do Tesouro, um porto seguro de renda e liquidez.

O segredo do negócio é a vigilância diuturna da matilha midiática sobre a boa gestão da dívida pública.

O dinheiro grosso investe nisso. Uma legião de consultores dá plantão permanente no telefone para esclarecer e municiar ventríloquos e ventríloquas dos mercados em suas obsequiosas colunas diárias.

Prover a ração bilionária destinada anualmente aos rentistas é o objetivo.

No linguajar técnico, trata-se de fazer cumprir a ‘meta cheia do superávit primário’.

Ou seja, o arrocho sobre o resto.

O corte adicional de R$ 10 bi nos gastos este ano, anunciado agora pelo governo Dilma, tem essa finalidade.

Reconquistar a ‘confiança’ rentista na política fiscal, teoricamente ensombrecida por artifícios contábeis – tolos, mas lícitos — cometidos em 2012.

A gendarmeria sustentada pelos rentistas para proteger seus interesses abriu fogo e fuzilou a administração fiscal, por conta da ‘manobra’ para fechar as contas em 2012.

Mídia, consultores, professores banqueiros e assemelhados puseram a faca na boca: o Brasil precisa de arrocho efetivo; corte real nas despesas, sem malabarismos contábeis.

E mais juros.

Porque a inflação, diziam, e agora se vê, era um engodo (como mostra Amir Khair, nesta pág) ameaça corroer a renda do capital a juro, finalidade primordial de uma nação, no entender do jornalismo embarcado nos mercados.

O governo aquiesceu em uma ponta e outra.

Não inovou nesse aspecto.

A agenda fiscal brasileira foi sequestrada pelo rentismo há muito tempo.

Discute-se de tudo –carga excessiva, gestão deficiente dos gastos, superávit insuficiente, maquiagens etc.

Menos o custo do próprio rentismo para o país.

Em média, o preço da supremacia financeira sobre a agenda fiscal custa R$ 200 bilhões por ano.

Cerca de 5% do PIB em juros pagos aos detentores de títulos da dívida pública.

Equivale a mais de dez vezes o custo do Bolsa Família que beneficia 13 milhões de famílias, 52 milhões de pessoas.

É quatro vezes mais o que supostamente custaria a implantação da tarifa zero no transporte coletivo das grandes cidades brasileiras.

Treze vezes o que o programa ‘Mais Médicos’ deve investir até 2014 em obras em 16 mil Unidades Básicas de Saúde; na aquisição de equipamentos para 5 mil unidades já existentes; com as reformas em 818 hospitais; para equipar outros 2,5 mil e providenciar melhorias nas instalações de 877 Unidades de Pronto Atendimento.

Repita-se: o dinheiro destinado ao rentismo em um ano daria para ampliar em 13 vezes a escala e a intensidade do programa ‘Mais Médicos’, atacando mais depressa as carências sabidas de infraestrutura e equipamentos de saúde.

Não serve de consolo, mas já foi pior.

No final do governo FHC, gastava-se quase 10% do PIB com juros.

O investimento público direto da União em logística e infraestrutura social era um traço.

Agora, o que a União investe oscila em torno de 1% do PIB (descontado o Minha Casa, Minha Vida).

Muito distante do desejável para uma sociedade que atingiu o ponto de saturação na convivência com serviços públicos insuficientes e de baixa qualidade.

A questão é saber quem vai amarrar o guizo no gato.

Dizer à população que, para cada um real destinado pela União a gerar escolas, hospitais e estradas, outros quatro vão para os bolsos da plutocracia rentista.

Naturalmente, não se trata de um capricho contábil.

A equação fiscal condensa uma correlação de forças.

Hoje ela reflete a supremacia das finanças desreguladas.

Não só aqui, mas em escala planetária, vive-se sob a coação permanente de fluxos voláteis de capitais, capazes de produzir a desestabilização de uma economia quando contrariados.

Inverter o jogo não se resume, assim, a uma mudança nas rubricas de receita/despesa.

Tampouco, porém, a equação pode ser naturalizada como uma fatalidade acima da história.

Aqueles que, a exemplo de Carta Maior, evocam espírito público da parte dos profissionais da medicina, diante da dimensão emergencial do ‘Mais Médicos’, não podem exigir menos da pátria rentista.

Mesmo sabendo de antemão que seu quociente de solidariedade é baixo.

Por certo, inferior a 0,38% dos cheques robustos que emite.

Essa era a alíquota da CPMF, derrubada em 2006, por um mutirão que reuniu a crème de la crème do espírito cidadão entre nós: a coalizão demotucana, os endinheirados e o jogral midiático conservador.

A ver.

terça-feira, julho 23, 2013

O mito do jornalismo chapa branca


Por Paulo Moreira Leite, em seu blog:

De vez em quando, leitores escrevem para reclamar que me consideram um blogueiro chapa branca em função de minha avaliação positiva das mudanças ocorridas no país depois de 2003, quando Luiz Inácio Lula da Silva assumiu a presidência da República.


Minha primeira observação é que boa parte dessas críticas refletem um comportamento interesseiro e seletivo. Essas mesmas pessoas não me chamariam de “chapa branca” se eu tivesse a mesma avaliação do governo Fernando Henrique Cardoso – ou mesmo da gestão do PSDB em São Paulo. Tentariam desqualificar argumentos, rebaixar uma discussão que é acima de tudo política, pois envolve valores e prioridades nas políticas públicas? Claro que não.
Não custa lembrar, na verdade, que o critério “chapa branca” não serve e nunca serviu como termômetro para se avaliar o trabalho de um jornal nem de um jornalista.

Em 1964, um único jornal de relevo, a Última Hora, era chamado de chapa branca. Os demais, adversários duros de João Goulart, jamais poderiam ser chamados assim. No 31 de março, todos estavam alinhados com o golpe militar que atirou o Brasil numa ditadura de 21 anos. Quem estava certo?

Três dias antes do golpe, o Correio da Manhã, que era favorável a Jango, mudou de lado e se alinhou com os adversários. No dia 31 de março, no célebre editorial “Basta!”, o Correio escreveu:

“O Brasil já sofreu demais com o governo atual. Agora, basta!”

No 1 de abril, quando Goulart ainda se encontrava no país e a vitória dos golpistas estava consolidada, o Correio publicou o editorial “Fora!” Disse: “Só há uma coisa a dizer ao sr. João Goulart: saia.”

Pergunto quem errou: o jornal que hoje seria chamado chapa branca ou aqueles que faziam oposição e ajudaram na correnteza que levou ao golpe?

Os inúmeros defeitos que se podem apontar no governo Goulart justificavam que se assumisse uma postura de oposição feroz e golpista?

Muitos leitores têm dúvidas sinceras sobre o papel do jornalismo e dos jornalistas ao longo da história do país. Há motivos antigos – como 1964 -- e recentes – como 2005 – para isso. Há oito anos, como se recorda, a partir da denúncia do mensalão, criou-se um ambiente de confronto e polarização entre o governo Lula e os meios de comunicação, que atravessou duas eleições presidenciais e chegou aos protestos de junho de 2013.

Para entender o que acontece hoje, é instrutivo ler o que escreviam nossos jornalistas – aqueles que não eram chapa-branca -- de meio século atrás. Há antecedentes lamentáveis e surpreendentes.

Vamos citar um dos mais influentes, Helio Fernandes, que dirigia a Tribuna da Imprensa e acusava Jango de promover a “pré-sovietização do país, que se processava num ritmo alucinante”. Convém prestar atenção à linguagem empregada para se referir aos aliados de Jango: “Na maioria das vezes são traidores. Outras, são mercenários; outras ainda, carreiristas; outras mais, negocistas satisfeitos.”

Dez anos antes, na conspiração que levou Getúlio Vargas ao suicídio, os grandes jornais brasileiros estavam unidos contra o presidente. Naquele contexto da Guerra Fria entre Estados Unidos e União Soviética, os jornais do Partido Comunista Brasileiro, hoje PPS, também atacavam o governo e denunciavam a “ditadura” de Vargas. Eles também não eram “chapa branca.”

Confiando que a revolução sob inspiração de Moscou estava a caminho, os comunistas trabalhavam pela derrubada de Vargas, a quem definiam como marionete dos “patrões americanos,” como recorda Mário Magalhães na biografia de Carlos Marighella. Quando Carlos Lacerda sofreu o atentado da rua Toneleros, o jornal do PCB uniu-se a oposição conservadora para emparedar o presidente: “Vargas responsável pelo covarde crime.” No dia em que Vargas deu o tiro no peito, a imprensa do PCB chegou as ruas com manchetes em tom celebrativo e acabou empastelada por uma massa de trabalhadores indignados.

Décadas depois, com uma coragem rara, José Gregori, então líder dos estudantes da Faculdade de Direito da USP que queriam a deposição de Vargas, admitiu em seu livro de memórias que em 1954 participou de uma “revolução errada,” feita às costas do povo.

Teria o ex-ministro de FHC se transformado num chapa branca retardatário? Ou foi um memorialista honesto, respeitando a própria lucidez?

Poderíamos falar de outros exemplos, dentro e fora do país, mas estes dois casos ajudam a mostrar o caráter abstrato e absurdo dessa discussão.

Foi Millor Fernandes quem cunhou uma frase que muitos repetem até hoje. Disse Millor: “Imprensa é oposição. O resto é secos e molhados.”

Podemos até admitir que Millor, um raro caso de intelectual libertário (no sentido antigo da palavra) por convicção pessoal e inegociável, estivesse convencido de que sua frase podia ser empregada a todo momento, sob qualquer cenário. Mas seu sentido real envolve o período da ditadura militar.

Depois de auxiliar na derrubada de um governo constitucional, os jornais foram colocados sob pressão do regime dos generais. Um pouco mais tarde, apesar daquelas palavras tão veementes, Helio Fernandes foi confinado em Fernando de Noronha depois de escrever um artigo que desagradava os generais. Outros jornalistas enfrentavam a censura e também engoliam imposições típicas de um regime de força. Alguns prestavam serviço auxiliar aos órgãos de informação da ditadura e não mostraram sequer a decência de proteger profissionais cuja integridade era colocada em risco pelo aparato de repressão e tortura.

Ao falar que “imprensa é oposição” o grande Millor alimentava a dignidade e a coragem do jornalismo num momento muito delicado.

Mas será que isso é válido, a todo momento? É preciso ser oposição, sempre, sob o risco de comprometer o bom jornalismo?

Ao lutar dentro da VEJA para ter direito usar as páginas da revista para manifestar seu apoio a eleição de Leonel Brizola em 1982, num conflito que levou a seu afastamento da publicação, o próprio Millor deixou claro que não tratava todos os políticos, em todas as circunstancias, da mesma maneira. Não só fez questão de defender sua liberdade pessoal mas também deixou claro que era mais oposição a uns do que a outros.

A vida política, que é o ambiente principal onde o jornalismo se situa, é fabricada pela conjuntura, que exige respostas novas a situações imprevistas, que não podem ser rebatidas com frases prontas – ainda que sejam ótimas, em outras situações. A crítica maior ou menor a um governo não é fruto de um critério abstrato e fixo, mas envolve uma avaliação do momento e do papel que cada governante pode cumprir em cada circunstância.

É claro que Fernando Henrique Cardoso sempre seria melhor tratado pela maioria dos meios de comunicação do que Lula ou Dilma. Isso porque, do ponto de vista político, ele representava opções que os donos e executivos dos meios de comunicação consideravam mais adequadas ao país. FHC foi alvo, sim, de jornalistas interessados em apurar as mazelas de seu governo. Mas havia limites a este espírito crítico. Embora Fernando Henrique tenha vencido duas eleições presidenciais em primeiro turno, os executivos de jornal jamais sentiram-se na obrigação moral de auxiliar a oposição de Lula com o argumento de que estava muito “fraquinha.”

A rigor, não me lembro das preocupações com “chapa branca” durante os oito anos de governo tucano. A principal crítica era ao “denuncismo”, conceito que que servia para tolher reportagens – verdadeiras ou falsas, – que poderiam prejudicar governo FHC. Até Paulo Maluf foi poupado para evitar-se um ambiente que pudesse estimular outras investigações. Isso confirma o caráter interesseiro do debate. Fala-se em "chapa branca" quando se quer atacar o governo. Em "denuncismo", quando se quer impedir que seja atacado.

Não acho que exista um governo imune a critica e a uma avaliação capaz de apontar defeitos e incoerências. Mas é errado fingir que não há diferenças entre os governos. Há valores e perspectivas. Os números alcançados pelo país, na ultima década, traduzem um esforço inédito para reduzir a desigualdade social e elevar a condição dos brasileiros mais pobres.

Você até pode ensaiar uma disputa pedante sobre direitos autorais de quem teria tido as melhores idéias mas não pode negar quem demonstrou mais empenho e capacidade para reduzir a pobreza e ampliar as oportunidades de quem se encontrava nos degraus mais baixos da pirâmide social. A luta contra a desigualdade, para mim, é o valor prioritário num país como o nosso. Ela define o caráter da democracia que queremos e do futuro que se pretende entregar as novas gerações. E eu considero que é a partir deste angulo que se deve examinar o conjunto de um governo.

Os sinais e prioridades se alteram ao longo do tempo para lembrar que o debate sobre “chapa branca” sempre surge numa situação específica, a partir de vozes que pretendem desqualificar interlocutores que têm outra visão do país e seus problemas.

Habituadas ao universo autoritário do pensamento único, algumas pessoas são tão conformistas, tão submetidas à hierarquia e à divisão entre trabalho manual e intelectual – que também se expressa na hierarquia das redações -- que não conseguem ouvir uma voz diferente com naturalidade.

Ficam inseguras, receosas. Num esforço para silenciar o debate, que todos fingem estimular fora do expediente, algumas vozes não resistem e perguntam, num chamado a ordem, numa espécie de porrete ideológico, onde parecem perguntar: mas o dono não está vendo?

Na essência, essa reação nada mais é do que um esforço vergonhoso para reprimir o direito de opinião política. Isso e apenas isso.

Talvez seja por coerência, e não por pura coincidência, que, em horas decisivas, essa postura acabe perfilada a forças capazes de ações extremas como um golpe de Estado.

Trata-se, em situações diferentes, de um mesmo combate contra valores democráticos.

Deu para entender?