quinta-feira, março 28, 2013

O pessimismo no retrovisor :: Delfim Netto

A divulgação dos números confirmando o fraco desempenho da economia em 2012 induziu à criação de um clima de pessimismo em relação à possibilidade de recuperação do crescimento neste ano, que somente agora começa a se dissipar com os sinais incipientes de retomada da produção industrial e da consolidação dos números do bom movimento do comércio embalado pelas festas de fim de ano.

O pessimismo foi, evidentemente, exagerado, na medida em que se ignorou o progresso social a gestar uma classe média mais educada e mais exigente de qualidade dos serviços públicos, sem a qual não se consolidam as instituições democráticas capazes de aumentar paulatinamente a igualdade de oportunidades.

Avanços importantes para a sociedade brasileira foram esquecidos durante o nevoeiro. Exemplos: a redução ordenada e consistente da taxa Selic; a bem-sucedida manobra de substituição dos juros reais de 6% nos rendimentos da poupança e o controle dos aumentos de salários no serviço público por três anos.

Em outras frentes, a aprovação do sistema previdenciário do funcionalismo, o enfrentamento dos custos nos setores básicos da energia e portuário, o aprendizado nos leilões de concessões nos projetos de infraestrutura para atrair o investimento privado.

E, ainda, a exoneração da folha de pagamento para setores industriais, que, combinada com a desvalorização da taxa cambial, recomeça a estimular a exportação de manufatura. E houve pequenos aperfeiçoamentos no sistema tributário, com reduções pontuais nos níveis de impostos.

Por último, mas não menos importante, registre-se a melhora do entendimento entre o poder incumbente e o setor privado, capaz de convencer o empresariado de que a política econômica do governo é amigável e objetiva o aumento da competição e da produtividade.

Isso pode nos levar a retomar o ritmo de um crescimento do PIB entre 3% e 4%, em 2013, como reafirmou a presidenta em recente seminário na Europa, em um encontro de empresários brasileiros e estrangeiros.

É preciso lembrar que medidas “macroprudenciais” introduzidas no começo por seu governo haviam sido recebidas inicialmente com grande ceticismo. O desenvolvimento da conjuntura mostrou que essas medidas foram não apenas altamente efetivas como talvez tenham sido subavaliadas. Posteriormente abriu-se um espaço para a redução consistente da taxa de juro real, reclamada há décadas pela economia brasileira.

A maior taxa de juro real do universo conhecido promovia um movimento de capitais especulativos a favor da supervalorização da taxa de câmbio real, acentuando os inconvenientes da redução da atividade global promovida pelo controle monetário.

Em um ano, o Banco Central trouxe a Selic a 7,25%, o que, com expectativa de inflação anual da ordem de 5,5%, nos deixou com uma taxa de juro real de cerca de 2%. Longe ainda da taxa de juro real do mercado internacional, hoje por volta de 2% negativos.

O atual diferencial de juro interno e externo é próximo de 4%. Em um ambiente de política cambial defensiva, ele ainda deixa margem para a exploração de oportunidades lucrativas para o capital estrangeiro de curto prazo, principalmente diante da contínua enxurrada de liquidez produzida externamente.

Com o nível de atividade atual, é claro que a preocupação com o crescimento assumiu um peso importante nas decisões do Comitê de Política Monetária (Copom), mesmo porque nossa política econômica é de “legítima defesa” contra as políticas monetárias externas que procuram desvalorizar suas moedas.

É preciso ser muito desinformado para não saber que os EUA tentam abertamente reduzir seu déficit em conta corrente, não apenas aumentando sua oferta interna de energia, mas estimulando um dólar “fraco” para ampliar suas exportações.

As incertezas e as fragilidades da situação mundial serão mais prolongadas do que se supunha. E deverão nos ajudar com alguma redução da pressão inflacionária externa. Vemos que o dissenso foi mais uma questão subjetiva: como cada um vê a velocidade e a eficiência com que o mundo poderá se livrar das incertezas criadas pela crise financeira de 2007.

É difícil decidir quem, afinal, estará certo, porque o futuro continua mais opaco do que sempre foi e inexiste, de fato, uma liderança política mundial forte e bem informada. É necessária certa humildade e desconfiar das afirmações de alguns analistas supostamente portadores da verdadeira “ciência econômica”. Que na realidade não existe.

Fonte: Carta Capital

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