quarta-feira, junho 06, 2012

O Copom controla a inflação?

Amir Khair Tenho defendido que a inflação é formada fundamentalmente pelo fator externo e que internamente pouco se pode fazer para influenciá-la. É tese polêmica, pois caso tenha fundamento, pode tornar desnecessária a ação do Copom como órgão encarregado de controlá-la e o regime de meta de inflação deixa de ter sentido. Deixa principalmente de ter sentido a prática de Selic elevada, que tanto mal causou ao País no desperdício com a gastança dos juros pagos pelo governo federal e nos lucros aos especuladores externos em operações de carry trade (tomar dinheiro emprestado num país e aplicá-lo em outro país com juro mais alto). Hoje em 8,5% a Selic, embora a mais baixa que o País já teve, é ainda a terceira mais alta do mundo. Haja anomalia! 1. Fator externo. O fundamento à posição que defendo pode-se dar observando duas situações inflacionárias ocorridas nos últimos cinco anos. A primeira, mais recente, se deu ao longo de 2011 e continua até agora. A partir de setembro de 2010, o preço das commodities começou a subir sem parar até o início do último quadrimestre do ano passado. Isso levou a inflação dos últimos doze meses a 7,3% em setembro de 2011. Com a queda dos preços das commodities ocorrida a partir de então, a inflação foi cedendo, terminando o ano no topo da meta de inflação em 6,5%. Isso ocorreu apesar de todo o esforço do governo para tentar evitar que atingisse tal nível. Vale destacar neste esforço a criação das medidas macroprudenciais, que ajudaram a reduzir a expansão do crédito e cinco elevações sucessivas da Selic, que passou de 10,75% no início de 2011 até atingir 12,50% em julho de 2011. A segunda situação abrange o período 2007 a 2011, observando 60 meses. O gráfico ilustra a forte dependência da inflação medida pelo IPCA dos últimos doze meses, ao preço médio das commodities no mesmo período. Isso é devido ao custo de insumos para a produção, que é fortemente influenciado pelo preço das commodities. Desde agosto do ano passado, o Banco Central (BC) vem avaliando que o que está influenciando a inflação no País é o fator externo que está desinflacionando os preços internacionais como consequência do avanço da crise na Europa, a semi-estagnação na economia americana e a redução do ritmo de crescimento da locomotiva China. Essa conjuntura internacional deve perdurar por alguns anos, segundo várias análises. Assim, a inflação brasileira deverá tender a ficar abaixo da meta de 4,5% independentemente da Selic, que poderá continuar caindo em ritmo mais intenso até atingir o nível médio dos países emergentes de 5%. 2. Fator interno. Além do fator externo, os preços monitorados pelo governo federal, estadual e municipal influenciam bem menos a inflação e tem-se mantido sempre abaixo do IPCA desde 2007. Isso significa que estão contribuindo para reduzir a inflação. Exemplo é o preço dos combustíveis da Petrobras, que se encontra congelado. O elevado spread bancário torna ineficaz a Selic como instrumento para controlar a inflação. A taxa de juro bancária que influencia o consumo e, portanto, a inflação, não guarda nenhuma relação com a Selic, conforme estudo do próprio BC. Assim, as reuniões do Copom com a finalidade de definir a Selic, carecem de sentido. 3. Consequências. Se a inflação é condicionada fundamentalmente pelo fator externo e este tem sido deflacionário, o governo pode se concentrar na política de crescimento econômico, que depende dos estímulos dados para a ampliação da oferta na produção e da demanda (consumo, investimento e despesa do governo). Outra consequência é deixar claro que inexiste predominância da política monetária sobre a política fiscal ou vice-versa, mas sim, integração dessas políticas com o objetivo de maximizar o crescimento. Em outras palavras, carece de sentido a independência do Banco Central. A responsabilidade última pelo desempenho econômico do País compete à presidente, que deve comandar sua equipe econômica. É o que está fazendo Dilma Rousseff. Para o crescimento, o governo definiu as metas até 2014 na Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO), que é de 4,5% neste ano, 5,5% em 2013 e 6,0% em 2014. A principal consequência da redução da Selic é o saneamento fiscal do País com equilíbrio nas contas públicas pela forte redução das despesas com juros e no custo de carregamento das reservas internacionais. Isso permitirá criar novo impulso aos programas sociais, deslanchar investimentos maciços na infraestrutura e propiciar desonerações fiscais de alto impacto na sociedade. Essa é uma das principais mudanças na política econômica do governo. O Copom, como afirmei, deixa de ter sentido para definir a Selic. Ela poderia ser definida pelo mercado e nesse sentido irá depender da necessidade do governo federal para rolar sua dívida mobiliária. Como pode emitir moeda ou título para isso, a queda da Selic será tanto mais intensa e rápida quanto mais preferência o governo der à emissão monetária. Essa emissão se faz urgente para depreciar o real e, com isso, tender ao equilíbrio nas deficitárias contas externas. A depreciação do real irá devolver parte importante da competitividade das empresas sediadas no País, que foi retirada pela política de restrição da base monetária. Essa base, como venho afirmando, é a mais baixa entre os países emergentes, e se for dobrada, irá atingir o nível mínimo que opera a Argentina e o México, ficando cinco vezes inferior à da China. Há no final das contas profunda inflexão na política econômica do governo ao atacar de forma incisiva a taxa de juro paga por ele (Selic) e a cobrada pelos bancos. O resultado é a folga fiscal que irá desfrutar o País e a redução do freio ao crescimento pela redução da taxa de juro bancária. Se proceder essa análise, pode ficar mais fácil fortalecer o País para se defender da crise em marcha e alcançar suas metas de crescimento. A conferir. Amir Khair é Mestre em Finanças Públicas pela FGV e consultor Fonte: O Estado de São Paulo

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