sexta-feira, setembro 02, 2011

Quem o povo escolhe?


As declarações de Dilma Rousseff de que “queremos que, a partir deste momento, comecemos a ter no horizonte a possibilidade de redução de juros no Brasil” foram o bastante para que comece uma “onda” de que a presidenta está colocando o Banco Central sob “pressão política”.

Previsões sobre o futuro dos juros, os bancos fazem toda a semana e nem por isso alguém reclama que o façam, até porque é parte essencial de seu negócio.

A presidenta querer que o país tenha “no horizonte a possibilidade de redução de juros no Brasil” está longe de ser ilegítimo ou anti-institucional, como sustentam a mídia e os comentaristas econômicos. Porque o Banco Central é uma instituição que, com toda a independência técnica, conduz uma política, a monetária, diretamente ligada ao desempenho da economia do país e, por conseguinte, à vida de seus cidadãos.

A declaração da presidente nada tem a ver, senão, com isso. É parte das responsabilidades de um governante zelar para que a nação que representa entre em retração econômica, que pessoas percam os empregos, que a indústria e os serviços se afundem e só uma parcela ínfima de pessoas sejam premiada com juros altos e lucros gigantes.

O Governo estivesse defendendo um esparramo de gastos irresponsáveis, está sinalizando com austeridade, com moderação nos gastos menos importante. A receita cresceu num ritmo muito superior à despesa e mesmo a redução dos investimentos ocorreu, além do que ocorre normalmente nos primeiros meses de governo, pela paralisação de grandes projetos viários onde houve suspeita de que o dinheiro estivesse sendo mal gasto.

O Banco Central tem elementos técnicos para parar a alta de juros e começar a reverter este processo. Nossa inflação não é de demanda – isto é, porque o povo está comprando muito – mas de três outras fontes.

A primeira, a cambial, onde assistimos uma guerra especulativa que sobrevalorizou nossa moeda e, para que isso não nos coloque em risco, nos obriga a comprar uma montanha de dólares. As reservas internacionais brasileiras, uma espécie de “colchão” para atenuar efeitos de crises mundiais sobre nossa economia subiu, de 1º de janeiro até meados de agosto, nada menos que US$ 64 bilhões. Esta guerra cambial gasta só mais em três meses que um mês da guerra do Afeganistão custa aos Estados Unidos, que lá gastam US$ 16 bilhões mensais! Porque a diferença manter este dinheiro, captado através de títulos públicos, em aplicações internacionais chega a US$ 19 bilhões por trimestre.

A segunda origem de nossa inflação, este ano, é a crise do etanol, de longe o maior ingrediente na alta de preços captada pelo IPCA – índice oficial da inflação, que beira os 7% acumulados em 12 meses. Não foi provocada por demanda, mas por falta de oferta, provocada pela falta de investimentos dos produtores e pela corrida às exportações de açúcar, em 2009 – quando se “desovaram” todos os estoques do produto e no ano passado, que fizeram a produção ser desviada do etanol.

E a terceira causa, a mais difícil de combater, foi o efeito da pressão exercida insistente e avassaladoramente pelos meios de comunicação de que estávamos vivendo uma explosão inflacionária de graves proporções. Isso atuou sobre os pequenos agentes econômicos de uma maneira perversa, provocando aumentos generalizados em pequenos serviços e comércios, com a natural reação de se protegerem de uma maré de desvalorização do dinheiro. A operação de “hedge” da pensão da esquina é aumentar R$ 1 no prato feito.

Além do mais, o gráfico publicado ontem aqui mostra que a curva de acumulação de aumentos de preços, tomadas na economia como um todo e não apenas na ponta do consumo, como faz o IPCA – mostra que temos, sim, uma desaceleração –e forte – na conta acumulada em 12 meses.

A baixa dos juros não é um atropelo técnico imponderado. Não é uma irresponsabilidade ou um voluntarismo econômico descalçado da realidade.

Porque aos fatores internos se somam os externos, dos quais ninguém já duvida, de uma retração da economia mundial que vai se refletir nos preços de nossos produtos de exportação que, caindo no mercado de commodities mundial, pressionarão menos os preços internos.

O Banco Central tem e deve ter toda a autonomia de como e, no ajuste fino dos prazos, quando fazer. Mas não tem a autonomia de decidir o que fazer. Esta responsabilidade, porque vital para o país, é daquele a quem o povo escolheu para governá-lo e conduzir o Brasil.

Um Presidente da República não pode ser um títere a quem cabe conduzir para lá e para cá um “sacerdote” do Deus Mercado, com sua mão já nem tão invisível.

Os avanços que, históricamente, este país conseguiu fazer ocorreram todos quando, num momento de refluxo mundial, tivemos coragem e decisão de remar na direção inversa. Foi assim na 2ª Guerra Mundial, quando começamos a deixar de ser prisioneiros da cafeicultura, foi assim na “marolinha”, quando nos voltamos para o mercado interno.

Quem não tem coragem de furar a onda, é levado por ela. E o Brasil não vai deixar que este período de expansão que vivemos, este momento de desenvolvimento com inclusão social inédito que atravessamos, vá morrer na praia.

Por: Fernando Brito

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