terça-feira, julho 19, 2011

O Estado indutor que precisamos



Delfim Netto, no Valor Econômico

Há alguns sinais preocupantes no horizonte para os quais temos de prestar atenção. O primeiro é a clara desarrumação política nos EUA revelada pelo cabo de guerra entre democratas e republicanos. O segundo é com relação à sucessão na China: há indícios de desacordos e ela não parece tão tranquila quanto as últimas. Ninguém sabe ao certo quando alguns problemas econômicos e sociais escondidos revelarão a sua cara. O terceiro é que a Eurolândia continua a tratar um problema de insolvência como se fosse de liquidez, o que a levará a maiores dificuldades. E o quarto é a visível mudança da mídia internacional com relação às perspectivas brasileiras. A impressão é que o setor financeiro se fartou de comer nosso peru com farofa fora do dia de Ação de Graças! Agora os "vendidos" parecem inquietar-se com os mecanismos que, em legítima defesa, o ministro Mantega tem tentado implementar.

A situação americana é realmente complicada: o presidente Obama aproveitou muito mal o "we can" que empolgou o país. Perdeu a confiança do setor real da economia. No início foi mal aconselhado política e economicamente pelos assessores que já devolveu à Academia. Em lugar de prestar atenção ao problema dos honestos que perderam o emprego, exagerou na salvação dos desonestos que produziram a crise. Os efeitos da política econômica com relação ao desemprego, que é a forma mais cruel de desperdício humano, podem ser vistos no gráfico 1, onde se compara a saída da crise de 2007/09 com as quatro que ocorreram desde o início dos anos 70. Ele revela o nível do desemprego nos EUA tendo como referência o mês em que o National Bureau of Economic Research estima o fim de cada recessão. Vemos que depois de um ano e meio do fim da recessão de 2007/09, a taxa de desemprego ainda ronda quase 10%, quando em todas as outras crises ela já havia se reduzido a qualquer coisa como 7,5%. O pior é que o "jeitão" do gráfico não é nada tranquilizador. Nada vai acontecer se o presidente Obama não recuperar a credibilidade e reduzir as incertezas.

Obama perdeu a confiança do setor real da economia
O dado mais sintético, que é a taxa de crescimento do PIB, também não parece confortador, como se vê no gráfico 2. Nele se registra o crescimento anual (trimestre contra o trimestre homônimo). Vemos uma rápida recuperação (em V) que depois de atingir o crescimento de "cruzeiro" (3%) dá sinais claros de enfraquecimento.

A informação fundamental para os emergentes é sobre a possível variação do dólar. Como ele é (e continuará a ser durante muito tempo ainda) a moeda que é a unidade de conta, de liquidação de compromissos e de reserva internacionais, o seu valor é determinante na formação dos preços nominais das "commodities". Isso influencia nossas relações de troca, o que explica, pelo menos em parte, a valorização do real. A trajetória de queda do dólar sugere que ainda há espaço para sua maior desvalorização. Não parece, portanto, que o mundo possa contar com uma recuperação robusta da economia americana antes das eleições de 2012.

Quanto à China, ela provavelmente vai crescer, mas não na mesma intensidade nos próximos 20 anos. Ela continuará a busca das três autonomias que caracterizam as potências: a alimentar (que ela persegue firme internamente com novas tecnologias e externamente com a compra de recursos naturais); a energética (com energias renováveis e métodos modernos da extração do "shale" gás); e a militar (que ela já tem suficientemente "dissuasiva"), com investimentos cada vez maiores para garantir o seu controle do "Mar da China".

É preciso não esquecer com respeito à China (e as nossas relações de troca), que os "preços acabam funcionando" e que seus níveis atuais acabarão elevando a oferta mundial de todos os nossos produtos de exportação (principalmente soja e minério de ferro) com consequências sobre eles.

O Brasil precisa colocar suas barbas de molho! Nosso modelo exportador agromineral induzido será incapaz de garantir empregos de boa qualidade para os 150 milhões de brasileiros que terão entre 15 e 65 anos em 2030. É disso que se trata. Precisamos apoiar um programa de desenvolvimento industrial e de serviços que promova forte competição interna e dê aos nossos trabalhadores e empresários inteligente proteção externa com condições isonômicas para exigir deles capacidade competitiva internacional. É, parece, o que nos oferecerá em breve a presidente Dilma Rousseff.

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