terça-feira, outubro 20, 2009

Evolução fiscal até agosto

O principal termômetro da evolução fiscal do País é dado pela evolução da dívida líquida do setor público (DLSP). Ver quadro ao final.



Os fatores que condicionam esta evolução é o déficit nominal (diferença entre as todas as despesas e receitas, inclusive financeiras), o impacto trazido pelo acúmulo de reservas internacionais e pela variação do câmbio, o crescimento econômico, as privatizações e o reconhecimento de dívidas (esqueletos).



No final de 2008 a DLSP foi de 38,83% do PIB e ao final de agosto último 43,96%, crescendo nesse período 5,13 pontos percentuais (pp) do PIB (43,96 – 38,83).



O principal responsável por este crescimento da DLSP foi o impacto causado pelo acúmulo das reservas internacionais e pela valorização do real frente ao dólar. Respondeu por 2,47 pp ou 48,1% do total deste crescimento. Em segundo lugar vem o déficit nominal com 2,21 pp (43,1% do total) causado pelos juros que acumularam nestes oito meses 3,69% do PIB, abatido do resultado primário de 1,48% do PIB. Em terceiro lugar vem o efeito da recessão econômica estimada para os oito meses que contribuiu com 0,51 pp (9,9% do total), pois o PIB é o denominador da relação dívida sobre PIB, e, finalmente, uma pequena contribuição favorável de privatizações com menos 0,06 pp (1,3% do total). Os “esqueletos” foram até o momento insignificantes.



As perdas fiscais causadas pelas reservas internacionais ocorrem de duas formas: pela valorização do real frente ao dólar e pelo diferencial de juros entre as taxas de aplicações externas das reservas e as taxas dos títulos federais.



Até o final de agosto as reservas internacionais atingiram US$ 219 bilhões e a dívida externa do setor público US$ 145 bilhões, dando um superávit de US$ 74 bilhões. No final do ano passado o câmbio foi de R$ 2,337 por dólar e no final de agosto último R$ 1,886. Essa valorização do real sobre o dólar causou uma perda fiscal na posição líquida externa superavitária. Além disso, o Banco Central ao comprar dólares, emite reais e os esteriliza vendendo títulos da dívida federal. As reservas internacionais são majoritariamente aplicadas em títulos do tesouro americano, que rendem pouco mais de 3% ao ano, ao passo que os títulos federais custam ao Tesouro Nacional a taxa básica de juros Selic, cujo mínimo de 8,75% ao ano ocorreu só a partir de 23 de julho último.



Os juros, isoladamente o principal responsável pelo crescimento da DLSP (3,69% do PIB), é consequência das altas taxas de juros dos títulos federais, que são direta ou indiretamente influenciados pela Selic.



É da exclusiva responsabilidade do Banco Central a política cambial, de gestão das reservas internacionais e da fixação da taxa básica de juros Selic, que constituíram os principais fatores condicionantes do crescimento expressivo da DLSP neste ano até agosto. As perspectivas parecem apontar para uma deterioração ainda maior da DLSP, pois as reservas continuam em ascensão e o câmbio neste início de outubro já está em R$ 1,75. É fundamental ampliar o debate sobre a questão fiscal no Brasil, incorporando todos os fatores que a influenciam.

Amir Khair

Inflação: previsão e realidade

Inflação: previsão e realidade



As previsões de inflação constituem importante instrumento para a tomada de decisões numa ampla gama de atividades para as empresas e para as pessoas. Essas previsões são fornecidas semanalmente pelo Boletim Focus que consulta uma centena de entidades do mercado financeiro e pelo Banco Central (BC) através das atas das reuniões do Copom e dos relatórios trimestrais de inflação. As previsões do mercado financeiro influenciam as do BC e vice-versa, razão pela qual são normalmente muito próximas.



Será que essas previsões se aproximam da realidade? Infelizmente a resposta é negativa, pois o coeficiente de correlação entre a inflação prevista e a ocorrida foi de apenas 17,2% (ver gráfico ao final). A razão disso é simples: são inúmeros os fatores que influenciam a inflação e esses fatores podem sofrer alterações significativas em seus comportamentos ao longo do tempo. Quanto mais distante no tempo, maior o risco de erro na previsão.



Por aí se vê a debilidade dos instrumentos que embasam o regime de metas de inflação, pois os modelos econométricos usados nestas previsões por mais sofisticados que possam ser não conseguem prever minimamente a inflação futura.



O último Boletim Focus de 09/10/2009 prevê as seguintes inflações médias medidas pelo IPCA: 4,29% em 2009, 4,39% em 2010 e 4,51% em 2011. O Relatório de Inflação de setembro do BC prevê para o cenário de referência, que considera a Selic no nível atual de 8,75% ao ano até final de 2011: 4,3% para 2009 e 2010 e 4,6% anual no primeiro e segundo trimestres de 2011, voltando para 4,5% no terceiro trimestre. Portanto, previsões praticamente idênticas às do mercado financeiro e comportamento da inflação ligeiramente acima do centro da meta só no primeiro semestre de 2011.



Mesmo com essas previsões de bom comportamento da inflação, o último Boletim Focus já prevê que a taxa Selic deverá subir em 2010 e 2011; essa taxa seria em média 10,0% ao final de 2010 e 10,3% ao final de 2011. Como as entidades do mercado financeiro ampliam seus lucros com a elevação da Selic é possível que estas previsões tenham um viés distorcido.



As razões apresentadas em diversas análises pelo mercado financeiro para a necessidade de elevação da Selic são: 1) forte crescimento econômico nos próximos trimestres, com uma inflação ainda baixa, mas crescente ao longo de 2010; 2) o nível de atividade atual e esperado e a inflação externa estarão operando na mesma direção de jogar a inflação para cima; 3) os juros estão muito abaixo do neutro (???) e; 4) não se espera ingerência política no processo decisório do BC em 2010.



Essas previsões parecem minimizar: 1) os efeitos da super oferta internacional de bens e serviços, que poderá durar por um bom período devido à queda do consumo norte americano, europeu e japonês, que são os maiores consumidores mundiais; 2) a desvalorização estrutural do dólar, que barateia junto com a super oferta as importações; 3) a boa safra agrícola no País prevista para 2010, com preços baixos segundo os produtores; 4) os avanços tecnológicos e de produtividade, que derrubam custos e preços e; 5) o efeito da deflação dos índices gerais de preços (IGPs) em 2009 que ajudam a derrubar a inflação do IPCA em 2010.



É possível que a continuar as inflações mensais sistematicamente abaixo das previsões do mercado a tendência da inflação em 2009 e 2010 fique abaixo de 4,0%, o que poderá levar o BC a ter que baixar a Selic para níveis mais próximos dos praticados internacionalmente.



A conferir.

Amir Khair